sexta-feira, 18 de novembro de 2011

LUZ INEXTINGUÍVEL


Mais poderoso do que os povos e as suas realizações através dos séculos, o Livro de cada época é um marco decisivo na história da evolução do pensamento.
Os Vedas, ditados por Brama aos richis, enriqueceram a India de espiritualidade durante milênios, e o Vedanta, que tem por objeto a sua explicação mística, até hoje domina a alma filosófica do povo hindu, iluminando-a com luz inextinguível.
A Pérsia milenária deixou-se conduzir pelo Zendavestá, atribuído a Zoroastro, e inundou-se de sabedoria que, há milênios, lhe norteia os caminhos, na busca da Imortalidade.
Israel, entre tormentos e inquietações, tem encontrado no Antigo Testamento, há quase cinco mil anos, o roteiro espiritual da liberdade buscada em todos os séculos.
Toda a Arábia passou a beber nas fontes augustas do Alcorão a Mensagem de Alá, transmitida ao Profeta em visões.
Desde então, sejam os pensamentos de Marco Aurélio ou os conceitos de Sócrates, apresentados por Platão, as poesias de Vergílio ou as antigas tragédias de Sófocles, o Novo Testamento, que nos apresenta a nobre vida do Homem que se fez maior do que a Humanidade, ou os Sermões de Vieira, o Livro é uma luz incomparável, colocando marcos históricos nos fastos da Humanidade.
Seja através da Divina Comédia, de Dante Alighieri, ou da Obra grandiosa de Cervantes, ou manuseando os conceitos de Castelar, após a Imprensa o homem passou a considerar o Livro como um monumento colossal dentro do qual se pode refugiar a Civilização, mesmo quando o horror da guerra ameaça a vida de extermínio total...
O Século XIX com as conquistas fulgurantes da Ciência, com as conclusões notáveis da Filosofia e com as pesquisas na Moral e na Religião, recebeu, numa Obra, o mais vigoroso trabalho filosófico de que se tem notícia: «O Livro dos Espíritos» que, embora a singeleza com que foi apresentado, em Paris, se fez o marco básico dos tempos novos, clareando mentes e conduzindo almas ao aprisco da paz, onde é possível uma felicidade imorredoura. Isto porque «O Livro dos Espíritos» difere, na essência, na estrutura e na planificação, de todos os que o precederam como daqueles que lhe vieram depois.
Não é a Obra de um homem nem a manifestação revelada de um só Espírito. É, talvez, a maior síntese que a Humanidade já leu em Filosofia Espiritualista, porquanto examina as consequências morais, através das Civilizações, apresentando os efeitos calamitosos dos desequilíbrios sociais, no homem reencarnado...
Não é um diálogo entre a alma que inquire e a voz que responde, embora o método dialético em que se apresenta. E' grandioso, igualmente, pelas conclusões do indagador e, na sua síntese preciosa, vai além dos problemas filosóficos, demorando-se em estudos de ordem metafísica, sociológica... Tentando oferecer soluções claras às diversidades étnicas, dentro de princípios essencialmente morais, conduzindo o pensamento em superior roteiro, capaz de libertar o homem das expiações amargas e dolorosas, em que se vem debatendo.
«O Livro dos Espíritos» é um Sol conduzindo, intrinsecamente, o seu próprio combustível. Guarda, na sua planificação, sabiamente, toda a Doutrina Espírita Codificada. Nele estão em germe os livros que viriam depois, abrindo novos horizontes à Ciência em «O Livro dos Médiuns», clareando os meandros da Religião em «O Evangelho...”. », explicando a essência da vida e sua origem em «A Gênese» e apresentando em «O Céu e o Inferno» consolações e punições necessárias ao progresso da alma encarnada ou desencarnada. E mais do que isto, a Introdução e os Prolegômenos deram origem aos opúsculos «Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita» e ao «O que é o Espiritismo».
Monumento mais grandioso que as tradicionais obras da Engenharia que o tempo corrói, «O Livro dos Espíritos» amplia o pensamento filosófico da Humanidade, derramando luz sobre a Razão entorpecida nas limitações do materialismo.
Espíritas! Homenageando a data de publicação d'«O Livro dos Espíritos», banhemo-nos na sua luz, estudando-o carinhosamente.
Não o olhar precipitado de quem se empolga com a narrativa romanceada, não a observação impensada de quem procura concluir antes de terminar o conteúdo, mas, estudo sério para sorvê-lo lentamente na taça augusta da meditação, e exame continuado e intermitente para absorver o pensamento divino que os Espíritos Superiores trouxeram ao espírito de escol do «Professor Rivail», o escolhido para projeção da Mensagem grandiosa que brilha como farol sublime na Doutrina Espírita.
Divulgá-lo e entendê-lo, senti-lo e apresentá-lo ao mundo é tarefa inadiável que a todos, espíritas e Espíritos, nos impomos como corolário natural das nossas convicções.
E recordando o seu aparecimento em Paris, há 113 anos, penetremo-nos de sua sublime mensagem, tornando-nos interiormente iluminados, para levar essa chama grandiosa às gerações do futuro, como ainda brilha entre nós a palavra de Crisna, Moisés, Jesus e tantos outros Embaixadores do Céu, e que «O Livro dos Espíritos» confirma e aclara.

Vianna de Carvalho
Por Divaldo P. Franco
Reformador’ (FEB) Abril 1970

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

VIDA DE RELAÇÃO


Hoje em dia, as Relações Humanas estão elevadas à condição de estudo especializado.
Firmas há que chegaram a instituir, em seu quadro de funcionários, o cargo de recepcionista, especialmente criado para lidar com o público.
Existe mesmo uma literatura específica, ensinando como fazer amigos, liderar grupos, influenciar os outros, fazer-se agradável no trato com os semelhantes, etc.
No entanto, isto que parece uma novidade ou que aparece como tal, é matéria elementar da Doutrina Espírita, herança do Cristianismo, sobre o qual erige ela os fundamentos da educação do ser.
Independente de muitos outros textos, esparsos pelas obras da Codificação Kardequiana, há este, inserto no tópico 8· do livro «O Céu e o Inferno», lª parte, capítulo IIl:
“A encarnação é necessária ao duplo progresso moral e intelectual do Espírito: ao progresso intelectual pela atividade obrigatória do trabalho; ao progresso moral pela necessidade recíproca dos homens entre si. A vida social é a pedra de toque das boas ou más qualidades.
                “A bondade, a maldade, a doçura, a violência, a benevolência, a caridade, o egoísmo, a avareza, ,o orgulho, a humildade, a sinceridade, a franqueza, a lealdade, a má-fé, a hipocrisia, em uma palavra, tudo o que constitui o homem de bem ou o perverso, tem por móvel, por alvo e estímulo, as relações do homem com os seus semelhantes.
                “Para o homem que vivesse insulado não haveria vícios nem virtudes; preservando-se do mal pelo insulamento, o bem de si mesmo se anularia.”
Dentro da vida é que o Espiritismo nos situa o campo de lutas e tarefas.
Seus conceitos renovadores nos fixaram rumos novos ·aos passos.
Segundo sua essência ideológica, muita coisa teve que ser refundida e reajustada.
Salvação equivale a esforço próprio, adquirida nos prélios redentores de nossa pauta de testemunhos, em estreito e íntimo contato com os nossos Irmãos em Humanidade.
Isolamento vale por expressão de vida interior, traduzida em estudo e trabalho, em oração e recolhimento espiritual, Cursos de preparação moral-religiosa, temo-los nos sistemas de acontecimentos com que nos defrontamos e por força dos quais aprendemos a viver e, cada vez mais, vivemos a aprender.
Religiosidade não é fanatismo, nem alheamento às coisas que nos cercam, antes significa dinâmica espiritual sustentada por cogitações mentais mais altas e ordens de ideias melhores e superiores.
Retiro espiritual representa tão somente afastamento do mal, libertação do erro e do vício, sem quaisquer barreiras divisórias entre nós e o próximo, como se nos isolássemos de alguém portador de moléstia infecto-contagiosa.
Adoração a Deus corresponde a consagração de nossa existência a serviço da Humanidade, a bem dos semelhantes, no templo do corpo pela iluminação crescente do Espírito.
O Lar, a Escola, a Igreja, a Oficina, o Laboratório, os múltiplos setores, enfim, das experiências e atividades humanas, são estágios ativos e fases dinâmicas de aprendizagem variada e diferente, em cada um dos quais nos é dado conseguir e consolidar, por vezes, maiores parcelas de conhecimentos e virtudes, de luzes e aquisições espirituais.
Aprendamos com Jesus que não devemos temer o mundo. Cultuemos a Vida, no que ela nos oferece de nobre e sublime, dando-lhe o melhor de nós mesmos. E, certamente, não será fora da engrenagem do mecanismo social, com seus altos e baixos, com seus dramas e tragédias, com suas grandezas e misérias, que iremos colher flores e frutos da semeadura dos ensinamentos cristãos. De outro modo, como poderíamos desenvolver o raciocínio, aprimorar os sentimentos, burilar as arestas de nossa alma, enrijecer a vontade, temperar o caráter, educar a mente, espiritualizar o coração, engrandecer os dons espirituais?
Necessitamos da Vida e do Mundo.
Todos poderemos prestar bons serviços, se soubermos prestar bons serviços a todos.
 A luz que dermos aos outros contribuirá para aumentar nossa capacidade de iluminação própria.
Instruídos, os ignorantes proclamarão as excelências do Conhecimento e exaltarão a grandeza da Sabedoria.
Consolados, os sofredores bendirão da alegria de viver.
Assistidos, os necessitados encontrarão estímulos para a luta.
Orientados, os inexperientes saberão compreender as realidades benfeitoras da trajetória terrena.
Esclarecidos, os perturbados recobrarão novo ânimo para a marcha triunfal de sua redenção.
Convertidos, os maus e pervertidos renascerão das próprias cinzas do pecado, seguindo novos rumos em busca de outros objetivos.
Perdoados, os adversários orarão por nós.
Amados, um dia, os ingratos amarão também.
Tais situações só serão possíveis em função de intercâmbio e convívio diário.
Precisamos de ouvir e falar, de sentir e amar, de lutar e viver, de assimilar e dar bons exemplos, de permutar impressões, de conhecer os homens, e de fazer que os homens conheçam os ensinos de Jesus, através de nossa conduta.
Carecemos da presença do nosso próximo, para com quem devemos estar animados do sincero e profundo desejo de prodigalizar todo o bem possível, buscando, por ele e com ele, edificar o reino dos céus em nós mesmos.
          
Lucas Pardal
Reformador’ Março de 1970.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

RESPOSTA A UM CATÓLICO

        

Vou explicar-vos as razões porque efetivamente não sou cristão no sentido emprestado erroneamente a esta palavra pela igreja romana.
Para esta seita, ser cristão não é cumprir os preceitos admiráveis do Evangelho; não é imitar, quanto possível, as sublimes lições da vida de Jesus.
Tanto assim que, sendo o Mestre um simples carpinteiro, o papa é rei com todo o cortejo de mundanas grandezas.
Enquanto o Cristo vestia a túnica dos pastores que não tem onde repousar a cabeça, seus pretensos continuadores cobrem-se de ouro e de púrpuras, alardeiam uma pompa de caráter pagão, cercam-se de luxo familiar aos tiranos do tempo de Sermacherib.
O Filho de Maria era humilde e perdoava as ofensas alheias; a igreja católica mostra-se sob um orgulho indomável e amaldiçoa, desde séculos, a quantos se não submetam a seus dessarroados caprichos.
Cristo espalhava, sem remuneração, os benefícios de um amor incomparável; a igreja vende os sacramentos, negocia com a salvação das almas, trafica com o reino dos céus.
Cristo profligava os erros e o despotismo dos fariseus bafejados pela riqueza da Terra; a igreja rasteja aos pés dos potentados.
No Rabino genial, conjugam-se as perfeições do missionário cumprindo à risca os desígnios da Providência; na igreja proliferam os crimes e os atentados contra a vida e a consciência de nosso semelhante.
A disparidade entre o ensino de Jesus e o dos concílios romanos não precisa de mais exemplos para se impor com a força dos axiomas irrespondíveis.
Cristo, no conceito católico, é o homem escravizado ao culto externo, às regrinhas da disciplina religiosa, às bulas e pastorais ejaculadas, de vez em vez, pelo ralo das autoridades eclesiásticas.
Ouve missa, bate nos peitos, confessa ao padre as suas mazelas espirituais, usa a veste das procissões, torce entre os dedos, maquinalmente, as contas dos rosários e crê no sortilégio dos escapulários.
Vive transido com o horror blasfemo de um Deus vingativo e implacável que tem embaixadores na Terra para a regularização dos negócios celestes. Isto não o impede, entretanto, de alimentar ódios, intolerância, dureza de coração, maledicências venenosas, invejas surdas, ambições insuportáveis e apego aos bens temporais. Não o impede de desejar todo o mal possível ao próximo, de vangloriar-se com o alheio infortúnio, de rogar pragas, atirar esconjuros sobre os que não comungam com os seus ideais.
A piedade, a doçura, a indulgência, a mansidão... São coisas de que não se ocupa absolutamente.
Rezando a sua ‘salve rainha’ e pondo uma vela a arder em face do oratório bento, dá-se por satisfeito, repousa a consciência no cumprimento dessas puerilidades.
De tempos em tempos, a penitência dos confessionários, com a deglutição complementar da hóstia, lavam-lhe os pecados velhos. Julga-se, então, apto para subir entre serafins tangendo liras vaporosas aos esplendores da felicidade eterna.
Mas, como a morte parece-lhe longe, torna a pecar e copiosamente, fiado no perdão já tantas vezes concedido às suas faltas anteriores.
Entre a prática do bem, das virtudes humildes e o abster-se de carne às sextas-feiras, ele prefere este “último sacrifício”. É mais cômodo, mais ortodoxo e produz resultados extraordinários.
Pode-se realizá-lo conservando o orgulho, o egoísmo, a vaidade, os rancores rubros que geram as explosões de criminalidade.

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Agora, vede o que é ser cristão segundo o espiritismo:
É ter gravado no recesso de nosso entendimento as passagens maravilhosas do Evangelho a fim de evitá-las nos casos concretos da existência humana. O espírita não bate nos peitos soturnamente, mas ama a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Não veste opa (capa sem mangas, mas com aberturas para enfiar os braços) nem se ajoelha ante imagens talhadas no mármore ou fundidas no bronze; adora o ser sensível com as efusões de sua alma extasiada com as magnificências da criação universal.
Para chegar no céu, dispensa o caminho dos confessionários e considera muito mais benéficos o perdão das injúrias, o amor à justiça, a piedade para todas as fraquezas, a doçura e o amparo para todos os infortúnios.
Faz-se menor entre os menores, combate a iniquidade, difunde a instrução, protege ao órfão, enxuga as lágrimas da viuvez desconsolada.
Não incensa aos orgulhosos cercados de grandezas e de glórias efêmeras, lastima-os.
Põe seus cuidados na vida futura, encara a dor como instrumento de progresso, resigna-se às opressoras contingências do planeta, porque a sua verdadeira pátria está além, no seio augusto da Misericórdia Suprema.
 As suas paixões guerreia sem cessar. E só se empenha tenazmente em conseguir moldar seu caráter nas linhas puras traçadas por Jesus para a edificação de todas as gerações.
Vianna de Carvalho
Reformador (FEB) 1.6.1918

domingo, 13 de novembro de 2011

ADIVINHAÇÕES


Meu amigo: você ainda pertence ao número daqueles que consideram os Espíritos desencarnados adivinhadores e pergunta o motivo pelo qual não pulverizamos as afirmativas dos detratores gratuitos e apressados do Espiritismo cristão. Julga você, acompanhando as águas de muita gente, que somos novas edições do velho Tirésias, precursor da “buenadicha” e que, à maneira dos criados linguarudos, devemos estar em dia com todos os segredos do próximo, a fim de, por esse processo fácil, dar-lhe a conhecer nossas atividades espirituais, de modo concreto e insofismável.

Creia, porém, que a lógica não autoriza semelhantes suposições. Se o Espiritismo tivesse por advogados tão somente os magos do revelacionismo barato, a grande doutrina jamais passaria de movimento anedótico, em que o palpite e o boato se encarregariam de interceptar a luz divina. Reduzir-se-iam as sessões a espetáculos caseiros, com a supervisão de palhaços sem corpo físico, e os assistentes voltariam à posição psíquica das crianças curiosas, que frequentam as salas de mágica, atentando apenas para a varinha do feiticeiro.

Acredita você que a Providência Divina permitiria o regresso dos mortos apenas para isso? O fenômeno transcendente da comunicação com o plano espiritual estaria circunscrito a meras demonstrações telepáticas?

Para muitas pessoas, a finalidade de nosso intercâmbio consiste em convencer os corações mais endurecidos, sem esforço. Os pais mortos imporiam convicções aos filhos, adivinhando-lhes as intenções e anulando-lhes o livre arbítrio, na esfera das realizações materiais. Os esposos falecidos continuariam à testa da casa, satisfazendo caprichos da companheira, por mais disparatados que fossem. Entretanto, a morte é chave de emancipação para quantos esperam a liberdade construtiva. E aqui, no “outro mundo”, somos naturalmente compelidos a imediato reajustamento do quadro de opiniões pessoais. As afirmações quixotescas dos adversários da verdade não chegam a modificar um til nas leis universais e as suas arremetidas injuriosas contra os servidores fiéis da causa do bem não passam de bulha infantil, em torno das sublimes fontes da Nova Revelação. Aliás, é razoável que digam insultos e asneiras, atendendo aos impulsos da boca deseducada. Ignoram a grandeza do verbo criador e, por vezes, não passam de anões espirituais fantasiados de gigantes físicos.

Nós outros, porém, que atravessamos a experiência do sepulcro, não podemos cair no mesmo nível. É indispensável examinar os problemas graves da vida, penetrar o conhecimento do destino e da dor, amparar a compreensão de eternidade nascente no mundo, e não seria lícito perder as horas em atender aos serviços de adivinhação barata.

Além disso, é preciso ponderar as deploráveis consequências das informações prematuras.

Referir-se-á você, naturalmente, aos belos serviços da psicometria na divulgação da doutrina consoladora. Sim, é certo. Não julgue, todavia, que esses trabalhos se efetuam sem o controle das inteligências esclarecidas de nossa esfera de ação. E não só os desencarnados necessitam disciplina em suas doações verbais: também os médiuns devem sofrear o desejo de adiantar ilações do que observam em silêncio, porque em assuntos de espiritualidade toda a prudência se faz imprescindível.

Li, algures, a história de um vidente moderno que passava por ser maravilhosamente verdadeiro. Certa vez, foi visitado por um homem que lhe pedia socorro para as aflições psíquicas. O cliente inquieto trazia consigo um quadro doloroso. Na existência passada, fora homicida e, no campo mental embora a benção do olvido no renascimento físico, estampava ainda a cena lamentável do pretérito delituoso. Desde a infância, em razão do resgate que deveria levar o efeito, era atormentado de pesadelos e tentações que pareciam sem termo.

Davam-no os médicos por vítima de perturbações congênitas, e como não lhe solucionavam a questão angustiosa recorreu ao sensitivo, sequioso de paz íntima. O médium, usando a sua faculdade de penetração noutros domínios vibratórios e sentindo-se vaidoso da franqueza que lhe era característica, movimentou o cabedal das apreciações próprias e falou-lhe abertamente do que via. Sem o espírito da caridade construtora, concluiu o vidente loquaz q quadro significava assassinato em futuro próximo, asseverando que o consulente mataria um homem. Retirou-se o enfermo d’alma em condições terríveis. Sugestionado pelo médium invigilante, passou a viver muito mais do passado criminoso, reconstituindo instintivamente as ideias sinistras de outra época. Deveria matar alguém e preparou-se para o horrível acontecimento. Correram os anos. Um, dois, três, quatro... O enfermo procurou eliminar diversos parentes e amigos sem resultado. Perdera o contacto com o trabalho sadio.

A ideia fixa do crime empolgava-o. Não dormia, alimentava-se mal e convertera-se em perigoso alienado, fora do hospício. A sua situação continuava angustiosa quando, certa noite, encontrou um homem a meditar numa ponte solitária. Não teria chegado o momento? Pensou. Não lhe cabia assassinar um homem? Perturbado, aflito, precipitou-se sobre o desconhecido e apunhalou-o. Mais alguns instantes e aclarava-se a identidade do morto. O assassinado era o vidente, fornecedor do pensamento inicial do crime. A ideia, pequena e insignificante a princípio, desenvolvera-se, crescera e agira contra o seu próprio criador.

Compreende você a responsabilidade dos que fazem conclusões precipitadas ou que adiantam informações prematuras? Responderemos por todas as imagens mentais que criarmos nos cérebros alheios.

Natural, portanto, nosso retraimento em matéria de pareceres inoportunos e novidades sensacionais. A obra evolutiva de cada um de nós pede tempo e experiência.

Se você deseja cooperar nas fileiras do Espiritismo cristão, instrua-se no conhecimento da verdade e edifique-se na prática do bem, abstendo-se de exigir o concurso dos seus amigos desencarnados, no campo do revelacionismo fácil. Divulgue, onde você vive e trabalha a mensagem de boa-vontade e colaboração evangélica que a fé e o esforço próprio gravaram em seu coração. Quanto aos detratores e perseguidores vulgares, não lhes conceda o apreço que estão muito longe de merecer. Entregue-os à luz abençoada da consciência, porque o sofrimento e a morte se encarregarão de transformá-los, no instante oportuno,

Irmão X

Lazaro Redivivo

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

A GRAVE QUESTÃO DA PREGUIÇA MENTAL


Um dos grandes obstáculos ao progresso humano está na preguiça mental. O homem prefere receber as informações “mastigadas” pela mídia ao invés de dedicar-se ao estudo que exige o raciocínio. A TV ainda impera sobre o livro.
Sabendo disso, muitos mestres, em todos os tempos, utilizam o recurso de contar estórias ou histórias para transmitir o ensinamento que se propõem a divulgar. E para prender a atenção do público a que se destina toda mensagem são revestida das mais variadas recursos que atraem.
Assim a TV, o rádio, o vídeo, o teatro. Muitas vezes o conteúdo não é bom, mas a embalagem atrai e prende a atenção. E engana como ocorre com a publicidade do cigarro, por exemplo...
E os espíritas, como ficamos? Temos uma maravilhosa mensagem, toda ela voltada para o crescimento do ser humano. Precisamos, sem dúvida, utilizar todos os modernos meios de comunicação para transmitir essa mensagem ao grande público. Os recursos tecnológicos da atualidade, como microfone, telão, vídeo, retroprojetor, projetor de slides, som, computador e outros facilitam muito a divulgação das idéias espíritas.
Voltando ao início de nosso pensamento, verificamos que o recurso de contar estórias ou histórias facilita e muito à transmissão da divulgação doutrinária. Não é por acaso que renomados autores encarnados e desencarnados usam a forma romanceada, e nem foi por outra razão que Jesus também usou as parábolas para ensinar. Este recurso realmente consegue transmitir o ensinamento com muita objetividade, facilita a memorização do ensinamento, prende a atenção. Na tribuna, por exemplo, ele tem um efeito excelente, principalmente se descontraído.
Mas, analisemos uma parábola de Jesus: A Parábola dos Dois Filhos. Em breve resumo, a parábola indica um Pai e dois filhos, convidados para trabalharem na vinha do Pai. O primeiro promete ir, mas não vai. Já o segundo filho, rebela-se dizendo que não vai, arrepende-se depois e acaba indo. À luz da Doutrina Espírita, podemos extrair o ensinamento da parábola. O texto em si é a embalagem que precisamos desembrulhar para conhecer o conteúdo e dele extrair o ensinamento. Também em breve resumo, podemos concluir que o Pai da parábola é Deus. Os filhos somos todos nós, detentores do livre-arbítrio, com a liberdade de opção de trabalhar ou não na seara do Pai. Seara é todo o campo de trabalho que Deus nos oferece.
Observemos que o Pai não impõe condições, nem reprova o comportamento. Respeita a liberdade dos filhos. Com o texto embalado pela estória, podem-se extrair muitos ensinamentos, em conteúdo e grande profundidade.
A parábola é um convite para sairmos da ociosidade, é um apelo ao trabalho em favor de um mundo melhor, porém a decisão é de cada um. Há muito que se fazer em favor uns dos outros, nos variados campos da atividade humana, mas também e principalmente no uso da caridade e do amor...
Já a assimilação do ensinamento só por palavras é como o filho que diz que vai e não vai, fica adiando sua transformação no bem ou o trabalho em favor do semelhante. Como diz a parábola, não é preferível o filho às vezes indisciplinado, mas que toma depois a decisão de se melhorar e trabalhar na vinha do Senhor? No pequeno exemplo da parábola referida está à embalagem a ser aberta e no seu interior a pérola do ensinamento. Libertemo-nos, pois, da preguiça mental e mergulhemos no raciocínio a fim de extrair da Doutrina Espírita, com sua extensa e variada literatura, as luzes do Evangelho de Jesus, a fim de não sermos os indecisos como cristãos de aparência que dizem, mas não fazem que adiem o progresso...
E para os que preferem a acomodação mental, continuemos a utilizar o recurso das estórias e histórias, a fim de fixar com mais facilidade a divulgação das idéias de Jesus e dos ideais de nossa querida Doutrina.
Para concluir, contudo, e considerando os valores libertadores trazidos pela Doutrina Espírita em favor do homem, trago aos leitores transcrição parcial do capítulo A Conclusão da Pesquisa, pelo Espírito Ignácio Bittencourt **, onde o autor, ao referir-se a minuciosa pesquisa levada a efeito nas Esperas Superiores, na qual os Excelsos Dirigentes do Espiritismo “chegaram à conclusão de que, junto às calamitosas quedas morais e às deserções deploráveis de numerosos companheiros responsáveis pelo serviço libertador, entre todas as causas que dificultam a marcha da Nova Revelação na Terra, destaca-se, em posição de espetacular e doloroso relevo, a preguiça mental”.

Orson Peter Carrara
REFORMADOR, NOVEMBRO, 1997

VIEIRA, Waldo. Seareiros de Volta, por Espíritos Diversos. 5ª ed. FEB, 1993.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O CORPO FLUÍDICO DE JESUS


 Os excelentes artigos escritos por Bezerra de Menezes com o pseudônimo Max, para “O Paiz” foram posteriormente enfeixados em 3 volumes que a Federação Espírita Brasileira editou, no ano de 1907, sob o título “Espiritismo – Estudos Filosóficos” todos são extraordinários, não fora seu autor o “Kardec Brasileiro”. Por isso mesmo, a Casa de Ismael está preparando uma nova edição da obra, na convicção de que os espíritas apreciarão sobremaneira possuí-la em sua estante, com o selo da FEB, da qual Bezerra de Menezes foi Presidente. Antecipando essa promessa, o Reformador” pública, a seguir, um dos capítulos já revistos, precisamente aqueles em que, dentre outros, a questão do corpo fluídico de Jesus é defendida pelo “Médico dos Pobres”.

Pareceu-nos sempre repugnante a fórmula sacramentária de estar Jesus, corpo, sangue e alma, consubstanciado na hóstia consagrada.
Se fosse um símbolo, nada opor-lhe-ia nossa razão; mas a igreja impõe aos fiéis à crença de que recebem na hóstia e pela hóstia o corpo e a alma do Cristo, tão real e perfeitamente como está no céu.
A fé passiva o que pode opor a tão formal imposição de quem tem o dom da infalibilidade em matéria dogmática?
O crente fanatizado o que pode divisar em semelhante fórmula, senão a manifestação de uma verdade absoluta?
A razão, porém, clama e clamará sempre contra todo dogma que envolva monstruosidade ou absurdo.
O pensador, embora crente, não admite que a suma perfeição se manifeste sob forma impura.
Aquele dirá: credo guia absurdo; enquanto este protestará, clamando: nihil absurdum a Deo.             
Ora, será racional que um Espírito tão elevado, tão puro, tão perfeito, que a igreja crê e manda crer que é um Deus; a segunda pessoa da trindade divina se imiscua se consubstancie com a matéria, de modo que se ache todo nesta?
Jesus é esse Espírito puro e santo, e, no entanto, ei-lo aí todos os dias dado e recebido sob a forma material!
Argumenta-se com as suas próprias palavras, que foram o fundamento do sacramento da eucaristia, pronunciadas na ceia, em que denunciou a traição e o traidor; argumenta- -se com estas palavras que foram: eis o meu corpo, apresentando o pão que havia benzido; eis o meu sangue, apresentando o vinho, também depois de havê-lo benzido.
Com efeito, conclui-se daí que Jesus corporizou-se no pão e no vinho, donde a naturalidade de sua corporização na hóstia consagrada.
É, porém, sabido que o divino Mestre usou sempre da parábola; de linguagem figurada, principalmente quando se referia ao que podemos chamar a parte dogmática de seus ensinamentos.
E isto é devido a não ter a humanidade de seu tempo a precisa clareza intelectual para compreender leis e fenômenos de esfera superior.
Ele dava o ensino sob a figura, para que, mais tarde, quando a humanidade já possuísse mais clara compreensão das coisas, entendesse esse espírito e verdade.
Um exemplo: nós ensinamos a nossos filhos, em criança, o Credo ou símbolo dos apóstolos; mas não Ihes explicamos, porque seria inútil, o sentido ou valor daquelas palavras.
Eles, porém, as guardam de memória, e quando sua faculdade de compreender já tem adquirido o necessário vigor, esse é o tempo em que eles apreciam, em espírito e verdade, aquelas palavras que Ihes ensinamos.
As que Jesus proferiu, quando consagrou o pão e o vinho, foram simbólicas, não podiam ser tomadas, naquele tempo, senão literalmente; mas elas encobriam alto ensinamento para quando a humanidade pudesse compreender as coisas em espírito e verdade, e não mais segundo a letra.
A igreja, recebendo a tradição literal, guardou-há até nosso tempo; mas a igreja de nosso tempo já devera ter compreendido que a corporização de um espírito como o Cristo é absurdo, e, pois devia ter posto de parte a letra e procurado o espírito daquele símbolo.
Se o tivesse feito, como lhe cumpria, mais que a qualquer outro, teria reconhecido que o corpo e o sangue de Jesus, dados a comer e a beber aos apóstolos, são o símbolo de sua doutrina, cujo ensino foi, por aquela cerimônia, confiado àqueles homens.
Se o tivesse feito, como lhe cumpria, teria reconhecido que um Deus não precisava materializar-se, para influir sobre o homem.
Deus, Espírito, influi sobre o homem, Espírito imaterialmente, por sua vontade, por um raio de sua luz.
Para que deixar-nos Jesus o seu corpo e o seu sangue, quando a virtude de seu Espírito está sempre conosco?
Ele, o espiritualista por excelência, consagrar fórmulas materialistas, sem necessidade e até contra seus próprios ensinos!
Como fica claro, racional e sublime considerar o pão e o vinho dados pelo Mestre como o símbolo de sua doutrina, que confiou a seus discípulos como a expressão de sua última vontade?
Recebeu-a Jesus sob a forma de pão, quando Jesus pode-se nos dar sob a forma imaterial, por seu perdão, por sua misericórdia, por seu amor!
Estamos ouvindo redarguir: por que não pode Jesus corporificar-se na hóstia, uma vez que tomou um corpo como o nosso?
Idem por idem! - o mesmo impossível! História do verbo encarnado para a infância da humanidade!
Jesus teve, com efeito, um corpo como o nosso pela forma; mas não pela natureza; teve um corpo fluídico, como tomam os anjos (Espíritos puros) quando descem a nosso mundo.
E é assim que a Virgem não deixou de sê-lo depois do parto, sem necessidade de um milagre, coisa que Deus não pode fazer; porque se o fizesse, transgrediria Suas próprias leis, que são eternas e imutáveis.
Só o imperfeito pode retocar sua máquina!
Ouvimos, ainda, replicarem-nos: então, Jesus não tomou sobre seus ombros os pecados do mundo, não sofreu pela humanidade?
Dizei-nos qual é maior, o sofrimento físico ou o moral?
Se Jesus não teve corpo material para sofrer, teve os sofrimentos mais cruciantes do espírito. E quem nos diz que seu corpo fluídico não se prestava tanto, e porventura mais do que o corpo carnal, à transmissão das sensações materiais?
O que é fora de questão é que repugna à razão o fato de um Espírito divino tomar a carne dos pecadores, e que a concepção espírita de ser fluídico o corpo de Jesus, não somente fala à razão e remove aquela repugnância invencível, como ainda explica, de acordo com as leis naturais, todos os fenômenos da vida do Redentor, e principalmente sua concepção no ventre puríssimo de Maria. Santíssima e seu nascimento, sem que a Mãe deixasse de ser Virgem.
O que é fora de questão é que S. Paulo consagra a doutrina espírita neste ponto, quando diz: que há corpos celestes e corpos terrestres.
Que serão os corpos celestes senão os fluídicos?
*
S. Paulo fala de corpos celestes e de corpos terrestres, que revestem os Espíritos.
Não se pode atribuir-lhe o pensamento de qualificar como corpo celeste o períspirito, certamente distinto do corpo carnal ou terrestre, pois que períspirito tem o Espírito encarnado, como o tem o desencarnado.
Corpo celeste, em oposição a corpo terrestre ou carnal, não pode ser senão de natureza que o torna impossível de coexistir com este, fato que não se dá com o períspirito, indispensável até às relações entre a alma e o corpo do homem.
Além disto, o períspirito acompanha a evolução espiritual, sendo material, pesado e grosseiro, enquanto o Espírito não o é, e desmaterializando-se "pari passu" com este, até tornar-se quase Espírito, até sumir-se, quando o Espírito chega ao estado de completa desmaterialização, que se chama - de puro Espirito.
Ora, falando S. Paulo do corpo que envolve os Espíritos mais elevados: puros Espíritos são óbvios que não se referiu ao períspirito: vestimenta que só usa enquanto não chega aquele grau de elevação, no qual a despe de todo, reduzindo a essência espiritual às três entidades que a constituíram na terra: corpo, períspirito e Espírito.
Se não é, pois, ao períspirito que se refere o apóstolo da caridade, quando fala dos corpos celestes que revestem os Espíritos puros, a que se referirá ele?
 A gênese, iluminada pela nova revelação, esparge a mais clara luz sobre este ponto da ciência, até agora envolto em brumas.
Deus criou um único elemento: matéria cósmica, fluido universal, a qual, evoluindo segundo as leis sábias, eternas e imutáveis, que foram postas, desde o princípio, à criação, dá de si tudo o que constitui o Universo, em todas as suas infinitas espécies e variedades.
É porque só apreciam esta evolução da natureza sem possuírem os instrumentos de penetrarem a causa primária criadora dessa natureza e das Ieis que a regem, que certos sábios acreditam que a natureza é a mãe universal, como de fato; e que é incriada - falso juízo que só tem por si as aparências.
Afirmam o que veem, e têm razão; negam, porém, o que não veem, e não têm razão; porque todos os dias descobrimos leis que não conhecíamos, e, portanto que não deviam existir, pois que antes não as víamos ou percebíamos.
O princípio de proceder tudo da natureza ou da matéria cósmica universal é verdadeiro, e nisto vamos com os materialistas; aquele, porém, de ser a natureza ou matéria cósmica universal existente independente de um criador é um erro, cujo fundamento é palpavelmente insubsistente e até ridículo: e que só é verdade, só existe o que vemos, apreciamos e compreendemos.
Não foi, porém, para discutir esta questão que tomamos a pena e, pois, entremos no nosso assunto.
O fluido universal, origem essencial de todos os seres do Universo, elemento integrante de toda a organização, substância componente de tudo o que existe, por sua condensação ou rarefação, que se der sob a ação das leis a que obedece a forma o reino mineral, o vegetal, o animal; forma os seres do mundo material e os do espiritual.
Compreende-se, pois, que por aquele mecanismo de condensação ele pode dar origem a seres como o Espírito e a seres menos essencializados que o Espírito, porém infinitamente mais que os corpos materiais.
Entre a rocha e a alma ou Espírito, os dois extremos da escala, uma variedade infinita das composições fluídicas.
Os Espíritos grosseiros e atrasados tiram do fluido universal seu revestimento, grosseiro como eles, a que chamamos corpo carnal.
Muito naturalmente os Espíritos mais desmaterializados, por seu progresso, tirarão um revestimento mais leve, mais desmaterializado como eles.
E os puros Espíritos tirarão um tão puro, tão vaporoso, tão essencializado como eles.
Isto é lógico, é racional e a experiência o comprova.
A tradição corrente em todos os povos, desde a mais remota antiguidade, consigna o fato de aparecimento dos mortos aos vivos, fato que nunca poderia dar-se, se o Espírito não vestiu um corpo visível.
A história sagrada refere inúmeros casos de anjos (puros Espíritos) baixarem a terra, para transmitirem a certos homens, justos, o pensamento do Senhor.
Poderão estes anjos revestir-se, para se fazerem visíveis, da mesma matéria que reveste as almas em suas aparições.
O meio donde tiram seus corpos instantâneos é o mesmo, é o fluido universal; mas a qualidade do fluido que escolhem é muito diferente.
As almas serve-se de seus períspiritos, mais ou menos grosseiros, substância colhida no meio comum, que elas condensam e tornam visíveis.
Os anjos, porém, que já não têm períspirito, por que são puros espíritos, precisam tomar, na ocasião, no infinito seio do fluido universal, o que os revista e os torne visíveis.
E como os Espíritos roubam àquela meia substância mais ou menos grosseira, mais ou menos essencializada, segundo seu grau de elevação nas vias do progresso, é óbvio que um Espírito angélico tira do fluido universal a sua mais pura essência; bem se pode dizer: a sua essência espiritual.
É a isto que S. Paulo chamou – corpo celeste - por oposição ao corpo que nos reveste, composto da mesma substância, mas não essencializado, espiritualizado.
De que é verdade o que aí fica exposto, temos a prova nas experiências de William Crookes, que obteve a materialização de um Espírito, ao ponto de tornar-se visível e tangível, tal qual uma pessoa vivente.
Estas agregações do fluido, para constituir um corpo visível, opera-se pela lei dos fluidos, que a ciência de nossos dias ainda ignora; mas que os fatos experimentais já recomendam ao estudo dos sábios, do mesmo modo como tem acontecido em todas as conquistas do saber humano.
Aqui, a ciência já é encaminhada pelas luzes que lhe dão as revelações espíritas.
Assim como o Espírito agrupa os elementos tirados do fluido universal e constitui com eles um corpo, assim, e sempre pelas mesmas leis fluídicas, ele desagrega aqueles elementos e dissolve instantaneamente o corpo fluídico; donde uma gravidez e um parto, com perda da virgindade, verdadeiramente aparente. 

Max     (pseudônimo do Dr. Bezerra de Menezes)
Reformador (FEB) Março 1974

("Espiritismo - Estudos Filosóficos", 1ª edição FEB, 1907, volume 3, págs. 349 a 358.).

terça-feira, 8 de novembro de 2011

OS EFEITOS MORAIS DO PERDÃO


“Reconciliai-vos o mais depressa possível com o vosso adversário, enquanto estais com ele a caminho.” (Mateus, 5:25.)

Jesus, na passagem registrada pelo evangelista Mateus, aconselha-nos a desvencilhar-nos dos dolorosos grilhões do passado obscuro, por meio da exemplificação do ato sublime de perdoar os que nos feriram, e solicitar perdão a algum de nossos irmãos que, pelos agravos que lhes tenhamos feito, se transformam em desafetos, muitas vezes, por razões de contraditas estéreis e pueris.
Na prática do perdão, o tema sugere ampla abordagem, mas gostaríamos de centrar essa análise nas dificuldades que surgem dos relacionamentos existentes entre os Espíritos que permanecem encarnados.
Determinadas pessoas, ao serem injuriadas, expressam indignação e revolta promovendo manifestações pessoais de cólera e superioridade na ânsia de agredir o ofensor e colocam-se na mesma posição do oponente ao quererem revidar as agressões recebidas. Nem sempre privilegiam a generosidade e a complacência e torna-se difícil esquecer o mal cometido contra elas ao exigirem retratação das afrontas recebidas, sem saberem perdoar com verdadeira simplicidade de coração. “O perdão sincero é filho espontâneo do amor e, como tal, não exige reconhecimento de qualquer natureza”.1
 Esquecem que as ofensas são perdoadas por Deus, na mesma proporção em que houverem perdoado os que as ofenderam.
Ao enunciar o  Pai Nosso, o Mestre nos ensina a pronunciar: “Perdoa-nos nossas dívidas, como também perdoamos nossos devedores” (Mateus, 6:12).2
 Allan Kardec indaga: “Esse perdão é, porém, incondicional? É uma remissão pura e simples da pena em que se incorre?”. Ele conclui que não, pois:
 [...] a medida desse perdão subordina-se ao modo pelo qual se haja perdoado o que equivale dizer que não seremos perdoados desde que não perdoemos. 3
 A caridade não consiste apenas em ajudarmos os que carecem de necessidades materiais ou que precisam de consolo para suas dificuldades morais, mas, principalmente, em olvidarmos e perdoarmos os insultos recebidos. Entretanto, como desculpar com verdadeira espontaneidade de coração, se na trajetória da existência surgem adversários que se tornam frios e indiferentes, influindo-nos para que sejamos também assim?
 Dentro dessa realidade, devemos aceitar as investidas daqueles que amamos, em forma de ingratidão e indiferença, após demonstrações de puro afeto que lhes outorgamos? Infelizmente, pelas imperfeições morais que ainda nos caracterizam a personalidade, cultivamos sentimentos de mágoa e rancor ao recordarmo-nos dos agravos que sofremos. Kardec, na análise que faz sobre a caridade, na sua mais ampla acepção, alerta-nos:

Com efeito, se se observam os resultados de todos os vícios e, mesmo, dos simples defeitos [...] todos têm seu princípio no egoísmo e no orgulho [...] e isso porque tudo o que sobreexcita o sentimento da personalidade destrói, ou, pelo menos, enfraquece os elementos da verdadeira caridade, que são: a benevolência, a indulgência, a abnegação e o devotamento. Não podendo o amor do próximo, levado até ao amor dos inimigos, aliar-se a nenhum defeito contrário à caridade, aquele amor é sempre, portanto, indício de maior ou menor superioridade moral, donde decorre que o grau da perfeição está na razão direta da sua extensão. [...]4
 O indivíduo que deseja perdoar sinceramente, consciente das consequências sublimes que esse ato acarreta, assume a atitude inspirada no Evangelho, valendo-se do admirável ensinamento: “Não vos digo que perdoeis até sete vezes, mas até setenta vezes sete vezes” (Mateus, 18:22). O perdão verdadeiro esquece, em definitivo, o mal recebido; não se gaba da concessão a fazer, sem vangloriar-se da absolvição concedida aos inimigos. Os que agem assim não se perturbam por “nenhuma raiz de amargura” (Paulo aos Hebreus, 12:15) e exemplificam atitudes de desprendimento e compreensão legítima, ao acolher com brandura o ofensor. Por esse motivo, Martins Peralva (1918-2007), escritor espírita, em uma de suas obras sobre os valiosos estudos do Espírito Emmanuel, observa:
 O perdão que o Espiritismo e os amigos espirituais preconizam em verdade não é de fácil execução. Requer muita boa vontade. Demanda esforço – esforço continuado, persistente.
 Reclama perseverança. Pede tenacidade. É bem diferente do perdão teológico, que deve ter tido, em algum tempo, sua utilidade. Não se veste de roupagem fantasiosa, não se emoldura de expressões simplesmente verbais.5

Aquele, pois, que se sinta ofendido deve esforçar-se para domar energias afetivas que, convertias em paixões desequilibradas, lavram ódios intempestivos, demonstrando que estamos longe e alcançar a sublimidade dos sentimentos, especialmente nos momentos de crises morais da vida.
 Deveríamos compreender de maneira decisiva as leis que regem as causas e os efeitos dos pensamento e atos que conservamos, reconhecendo que ainda nos deleitamos situações de represália para com as pessoas que nos combatem. A paz é patrimônio divino que se torna imprescindível defender! O Espírito Angel Aguarod, em análise sobre a questão, afirma categórico:
 O desejo de paz, nos que ainda não chegaram ao ponto médio da evolução, permanece em estado de aspiração, por não terem sabido tirar dos descalabros sofridos as consequências naturais que deles brotam e mediante as quais aprende o ser racional a cimentar a paz na própria paz, isto é, na paz da alma, que exige, para tornar-se efetiva, a eliminação de todo sentimento antifraternal [...].6
 Nesse contexto, proliferam sentimentos contrários à caridade e que influenciam nocivamente a sociedade e os indivíduos que a compõem. Ora, se “o progresso material de um planeta acompanha o progresso moral de seus habitantes”,7 inferimos que, ao atuar desse modo, não conseguimos aplicar o livre-arbítrio para disseminar a Doutrina Espírita na Terra, à luz do Evangelho. Querer lutar em objeção aos adversários, magoando-os, muitas vezes, em condição humilhante, com o propósito de desforra, afasta-nos da bondade e da indulgência sinceras, mormente ao desdenhar os esforços daqueles que porventura pretendem reconciliar-se conosco.
 “Quem perdoa liberta o coração para as mais sublimes manifestações do amor que eleva e santifica”.8
 Para tanto, é urgente buscar o progresso individual; interrogar mais assiduamente a consciência e verificar quantas vezes fracassamos no trato com as pessoas que nos cercam na esfera familiar, no ambiente profissional, no grupo espírita e em outros círculos que vivenciamos em prol da evolução particular. Luminosos conselhos são oferecidos por Santo Agostinho, em benefício do conhecimento de nós mesmos:
 [...] Quando estiverdes indecisos sobre o valor de uma de vossas ações, inquiri como a qualificaríeis, se praticada por outra pessoa. Se a censurais noutrem, não na podereis ter por legítima quando fordes o seu autor, pois que Deus não usa de duas medidas na aplicação de sua justiça. Procurai também saber o que dela pensam os vossos semelhantes e não desprezeis a opinião dos vossos inimigos, porquanto esses nenhum interesse têm em mascarar a verdade e Deus muitas vezes os coloca ao vosso lado como um espelho, a fim de que sejais advertidos com mais franqueza do que o faria um amigo. [...]9
 Paulo, o apóstolo, em mensagem inserida em O Evangelho segundo o Espiritismo, 10 convida-nos a avaliar as próprias características comportamentais e mostra-nos que somos Espíritos exigentes, inflexíveis, duros e  rigorosos, nem sempre atentos à possibilidade de reconhecer que os rompimentos podem ter sido iniciados por nossa culpa ao convertermos em  querela grave o que poderia, facilmente, ter sido deslembrado. O perdão não exclui a necessidade da vigilância, e o amor ao próximo deve pautar as decisões que tomarmos para não termos dúvidas quanto a reconciliar-nos com os nossos opositores, conforme recomendação de Jesus.


 Reformador  • Outubro 2011

Referências:
1 XAVIER, Francisco C. O consolador. Pelo Espírito Emmanuel. 28. ed. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Q. 335.
 2 DIAS, Haroldo Dutra. (Trad.) O novo testamento. Brasília: EDICEI, 2010. p. 55.
 3 KARDEC, Allan. O céu e o inferno. Trad. Manuel Quintão. 2. ed. bolso. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. P. 1, cap. 6, it. 6.
 4______. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 25. ed. bolso. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010.Cap. 17, it. 2.
 5 PERALVA, Martins. O pensamento de Emmanuel. 9. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 24, p. 175.
 6 AGUAROD, Angel.  Grandes e pequenos problemas. 7. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 6, it. 3, p. 216-217.
 7 KARDEC, Allan.  A gênese. Trad. Guillon Ribeiro. 2. ed. bolso. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 11, it. 27.
 8 PERALVA, Martins. O pensamento de Emmanuel. 9. ed. 1. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 24, p. 177.
 9 KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 14. ed. bolso. 3. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Q. 919a, p. 451.
 10______. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 25. ed. 3.reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Cap. 10,it. 15