domingo, 29 de setembro de 2013

O DIREITO DE VIVER


É cediço que o ser humano recebe do supremo Dispensador do universo incontáveis recursos naturais que compõem a essência de sua vida.

Entre tais recursos destaca-se o direito de viver como o mais fundamental entre todos, por ser o pressuposto dos demais recursos passíveis de serem usufruídos pelo ser humano.

Antes, porém, de adentrar na análise do tema propriamente dito, para maior clareza desta relevante questão, convém perguntar o que seria mesmo o ser humano ou, por outra, quais são seus componentes.

Ser humano é o ente que resulta da união entre o Espírito e o corpo humano, sendo aquele o ser essencial para o qual a vida humana é o objeto, e este último, o corpo, o ser instrumental, destinado a proporcionar ao Espírito os meios de atingir seus elevados fins: a perfeição. À frente do direito de viver na matéria, pressupõe-se o acesso à vida física, como a mais rica experiência do Espírito numa determinada fase de sua trajetória evolutiva, à semelhança de enorme parcela de Espíritos reencarnados no planeta Terra.

No atual estágio evolutivo da humanidade terrestre, não se pode mais realizar a análise deste tema – o direito de viver –, com o mínimo de profundidade, se não se levar em conta o ser espiritual que anima o corpo humano e que é, sem contradita, o ser real, essencial e o verdadeiro destinatário da vida humana na Terra.

Assim, por meio da indução, somos racionalmente levados à mais elementar conclusão de que a vida terrena não se restringe à mera satisfação das necessidades inerentes ao corpo físico, sob pena de reduzirmos os mais elevados, fundamentais e altruísticos sentimentos e valores humanos a uma quimera a ser decomposta pelas reações químicas num túmulo fétido ou reduzida a cinzas num forno de cremação, em que as mais caras e puras afeições não passariam de momentos fugazes e não valeriam mais do que um apetitoso prato de iguarias, solapando pelas raízes qualquer fio de esperança; reduzindo o ser humano a uma vida de cálculo, sem a menor perspectiva; embrutecendo todas as relações, em que o certo e o errado, o bem e o mal, perderiam qualquer razão de ser.

Por isso, o que levaremos em conta na nossa reflexão será principalmente o Espírito e não o corpo físico, porque nossa singela abordagem será realizada pela ótica eminentemente espírita, apesar do nosso mais profundo respeito a todos os ramos do conhecimento humano, que também oferecem fundamentados argumentos sobre o assunto, principalmente se ventilado sob ótica diferente.

O Espiritismo tem em seu conteúdo, como fonte principal, as revelações feitas pelos Espíritos superiores, encarregados por Jesus Cristo de resgatar o real sentido, a pureza e a simplicidade de sua mensagem divina e confirmá-la, em consonância com os avanços intelectuais, alcançados pela humanidade do nosso tempo. Assim, na questão 880, de O livro dos espíritos, Kardec pergunta aos Espíritos encarregados das revelações:

Qual o primeiro de todos os direitos naturais do homem?

“O de viver. Por isso é que ninguém tem o direito de atentar contra a vida de seu semelhante, nem de fazer o que quer que possa comprometer-lhe a existência corporal.”

Os Espíritos deixam claro que, ao se tirar a vida de alguém, o mal maior não é o de simplesmente eliminar o fio da vida física, mas os incalculáveis prejuízos decorrentes desse ato, conforme se pode extrair da resposta dada à pergunta 746:

É crime aos olhos de Deus o assassínio?

“Grande crime, pois aquele que tira a vida ao seu semelhante corta o fio de uma existência de expiação ou de missão. Aí é que está o mal.”

Isso se explica porque é fato que todos morreremos um dia, sendo, porém, necessário que a morte ocorra, em qualquer circunstância, no tempo prescrito por Deus, para que o Espírito possa atingir seus objetivos predeterminados a realizar no corpo, usufruindo integralmente dos seus benefícios.

O grau de maturidade moral e intelectual que o homem mediano atingiu na Terra não mais permite conceber que a vida humana seja a manifestação de um fenômeno fortuito, sem objetivo e sem justa causa, por isso é imprescindível e urgente aprofundar a visão.

Na questão 132, pergunta-se aos Espíritos:

Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?

“Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da Criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta.”

Importa destacar que os Espíritos responderam às perguntas de acordo com o grau de progresso atual da humanidade terrena, pois o planeta Terra encontra-se num grau evolutivo em que a reencarnação do Espírito tem objetivos delimitados e voltados para atender as suas necessidades atuais, razão por que, na questão 167, os Espíritos esclarecem sobre o fim que se objetiva com a reencarnação, nos seguintes termos:

Qual o fim objetivado com a reencarnação?

“Expiação, melhoramento progressivo da humanidade. Sem isto, onde a justiça?”

Assim, quem tem um objetivo, um propósito, uma necessidade de viver na Terra não é o corpo físico, mas o Espírito que o anima e que necessita dar mais um passo na direção do seu aperfeiçoamento. Quando, portanto, se impede que um corpo nasça na Terra, frustram-se os objetivos do Espírito que necessita reencarnar. Para melhor compreensão, lembremos que a Terra, no atual estágio evolutivo, é uma escola, um hospital, uma oficina de trabalho, um campo de pesquisa, uma sagrada oportunidade de convivência social, psicológica e sentimental do mais alto valor para a evolução moral e intelectual do Espírito.

Diante do exposto, impedir um ser humano de nascer é fechar, para o Espírito que deseja e necessita ardentemente aprimorar-se, as portas de acesso ao conhecimento, à saúde, ao trabalho, à convivência social, ao exercício do amor que a vida num corpo físico pode proporcionar.

A propósito, respondendo à pergunta 357, os Espíritos elucidam nos seguintes e precisos termos:

Que consequências tem para o Espírito o aborto?

“É uma existência nulificada e que ele terá de recomeçar.”

Observamos que o mal decorrente desta ação não se resume em simplesmente impedir a manifestação da vida, por matar um corpo, mas arruinar, comprometer toda uma existência de alvissareiras perspectivas para o Espírito, o que torna a ação muitíssimo mais grave.

Assim, inúmeras consequências poderão advir para os responsáveis pela prática do aborto. Porque é necessário indagar, também, qual será a atitude que adotará o Espírito que é rejeitado, impedido covarde e egoisticamente de exercer o legítimo direito que Deus lhe outorgou. Não se trata de ameaças, mas de convite à responsável reflexão, porque não somos mais uma sociedade de Espíritos primitivos. Temos o dever de assegurar ao outro o direito que nos foi garantido.

Imaginemos uma sociedade que impedisse suas crianças de ter acesso à escola, seus doentes de receber o auxílio hospitalar, seus cidadãos da oportunidade do trabalho dignificante? Por mais passivas que sejam essas criaturas, nada impedirá que gravíssimas e naturais consequências destas atitudes recaiam sobre seus responsáveis, bem como sobre toda a sociedade, não significando de modo algum castigo de Deus, mas reação pura e simples da lei natural de causa e efeito.

Estamos num estágio de evolução, repetimos, em que não mais podemos sequer cogitar de corrigir um mal praticando outro igualmente hediondo e muito mais irracional, cruel e monstruoso, num verdadeiro atestado de incapacidade ou mesmo de má vontade de buscar as soluções pela aplicação do amor ao bem, sob as luzes infinitas da sabedoria, filha direta da inteligência...

 Somente conhecendo a natureza, os fins, as causas e os efeitos que regem a vida, seremos capazes de preservá-la, agindo de conformidade com os superiores objetivos do Criador, baseados no amor, na sabedoria e no bem.

 

REFORMADOR SETEMBRO 2013

 

Referência:

KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Trad. Guillon Ribeiro. 93. ed. 1. imp. (Edição Histórica). Brasília: FEB, 2013. q. 132, 167, 357, 746 e 880

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

FIÉIS, HONESTOS E SINCEROS.


 
O Cristo de Deus sempre utilizou grandes missionários para fazer progredir, no mundo, a sua obra divina. E cada vez que um deles abençoou, com a sua excelsa presença, a Humanidade terrena, aqui deixou, ao regressar aos seus pagos celestes, não somente nova sementeira de luzes imortais, senão também a fecunda inspiração dos seus exemplos edificantes, capazes de suscitar discípulos e imitadores, em favor da continuidade do trabalho do bem. Os revérberos de sua brilhante claridade espiritual permanecem por muito tempo na atmosfera do orbe, suprindo de algum modo o vazio deixado por sua ausência na crosta planetária. Antes, porém, que esses revérberos esmaeçam, outras grandes almas esplendem de graça divina no cenário do mundo, a atestar a riqueza infinita do Criador e o poder amoroso do Cristo.

Pela sublimal elevação que nos revelam e pelo bem que nos fazem, esses grandes tarefeiros de Jesus merecem de todos nós o mais profundo respeito, a mais acrisolada gratidão e todo o amor que sejamos capazes de lhes oferecer. O que eles não merecem é que façamos deles bandeiras de discórdia e que lhes usemos indebitamente o nome e o trabalho para tentar desacreditar instituições, movimentos e pessoas. O que eles positivamente não merecem é que procuremos usar-lhes a bondade e a presença para procurar colocá-los como recurso ou alternativa mais alta contra companheiros de ideal e suas organizações mais responsáveis. E, sobretudo, o que eles não merecem é que lhes exploremos antecipadamente a desencarnação, para fomentar, desde já, o descrédito generalizado dos que permanecerão a postos, no campo das lutas terrenas, instigando desacordos, inconformidades, dissenções e separatismos.

É muito natural que seja dolorosa para nós a expectativa do regresso, aos Céus, de algum servidor do Mundo Maior, que esteja em serviço reencarnatório sobre a face da Terra. Dor de saudade antecipada, precoce sensação de perda de um convívio que ainda não merecemos seja permanente. Jamais, porém, presságio de caos, de irremissível desorganização das estruturas terrestres da obra divina, como se o poder de Deus, do Cristo e de Ismael, e a boa-vontade sincera dos lidadores humanos de boa-fé, nada valessem.

O próprio Mestre Divino, após legar-nos o seu Evangelho de Amor, ausentou-se do chão planetário, deixando a sua mensagem aos cuidados dos seus Apóstolos, que também, cada qual por sua vez, partiram deste mundo. Estêvão, Paulo e a gloriosa Mãe Maria de Nazaré, também retomaram, um dia, às regiões etéreas de onde provieram. Assim Francisco de Assis, assim Vicente de Paulo, assim Kardec... Nenhum deles transferiu a ninguém a sua própria tarefa, por ser isso impossível. Não se herda nem se lega dons espirituais ou responsabilidades da alma!

Apesar disso, o plano divino jamais deixou de ser cumprido, mais depressa ou mais devagar, conforme as circunstâncias, porém nunca deixou de progredir. Não há de ser agora, neste fim de milênio e diante de uma nova era, de importância vital para a Humanidade, que a desencarnação de um missionário, por maior que ele seja, combalirá o Movimento Espírita da Pátria do Evangelho. Realmente, os homens podem, sob o influxo de Inteligências malignas, fazer de quaisquer nomes e de quaisquer obras motivos de animosidade e perversão, como fizeram até mesmo com o nome e com o Evangelho do próprio Senhor Jesus-Cristo. Isso, porém, só voltará a acontecer se, embora iluminados pelas luzes do Celeste Consolador, não conseguirmos ser, como de nós se espera, servidores do bem, fiéis, honestos e sinceros.

 

Editorial

Reformador (FEB) Junho 1978

terça-feira, 24 de setembro de 2013

RELIGIÃO É VIDA



"Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vai ao Pai senão por mim”.  Jesus (João, 14:6).

 

Você é convocado para uma nova ideia de Religião.

Não se trata de mera inovação humana. É o retorno ao sentido legítimo de Religião.

Certo é que Você terá visto muita gente fazendo do templo de fé o local da prática religiosa.

 
Templo, porém, é escola do coração.

Ali se aprende.

A prática dos ensinamentos morais do Cristianismo puro, contudo, pede por palco a própria vida.

Nada de locais restritos e especiais.

É junto de seus familiares, ao lado de seus amigos, no encontro com seus desafetos, que Religião alcança a sua dinâmica de "ligação com Deus".

Jesus viveu religiosamente em toda parte.

Jamais fugiu do mundo.

 Você é chamado para isso: para viver no campo do amor ao próximo, ajudando a construir um mundo novo a partir das fronteiras de seu próprio mundo íntimo.


Evangelho é mensagem de Vida.

A sua presença, no cotidiano, corresponde a um abrir de olhos, a uma visão mais ampla da existência, permitindo que Você se coloque corajosamente diante de Você mesmo.

A Boa Nova é o caminho.

 

Os Espíritos, rompendo com as barreiras do Além, vêm convocá-la para rasgar os horizontes de novas esperanças.

 

Eles e Você estão juntos.

O grande desafio, que abala os orgulhosos e confunde os egoístas, é para que Você tenha a coragem de amar, de querer paz, de construir e reconstruir o seu destino.

A serenidade é o salário do Bem.

 

J.  Alexandre 

Reformador (FEB)  em Jan 1974

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

TALISMÃS, FITINHAS DO “SENHOR DO BONFIM” E OUTROS AMULETOS NUM CONCISO COMENTÁRIO ESPÍRITA.


 

Para o enredo místico os “talismãs são objetos de proteção, imantados de força magnética, ao qual se atribui um poder sobrenatural de realização dos desejos do usuário”.

Os amuletos são os objetos consagrados através da magia que devem ser usados junto ao corpo (anéis, correntes, medalhas).

Segundo creem, um objeto sagrado tem uma função (proteger, vincular, aproximar) determinada pela sua forma no plano material (gravura, anel, estátua, medalha, porta-incenso). Por outro lado, a natureza da energia que pode ser canalizada pelo objeto varia de acordo com o símbolo ou divindade que este objeto represente.”(1)

Acatamos fraternalmente o nível moral de quem usa e crê na eficácia dos talismãs e amuletos, entretanto, quem utiliza cristaliza a fé, razão pelo qual não recomendamos o uso de implementos místicos , até porque são inúteis e completamente dispensáveis.

Na compreensão espírita “a virtude dos [talismãs e amuletos] de qualquer natureza que seja, não existe senão na imaginação das pessoas crédulas[ingênuas].”(2)

O Espiritismo e o magnetismo elucidam uma vastidão de fenômenos sobre os quais a ignorância teceu um sem-número de fantasias mitológicas, em que os eventos se oferecem excedidos pela imaginação. “O conhecimento lúcido dessas duas ciências [Espiritismo e o magnetismo] constitui o melhor preservativo contra as ideias supersticiosas, porque revela o que é possível e o que é impossível, o que está nas leis da Natureza e o que não passa de ridícula crendice.”(3)

Os Espíritos Superiores dizem que os crédulos na força do talismã podem atrair seres espirituais de qualquer natureza, posto ser o pensamento a energia induzidora enquanto o apetrecho tão somente uma referência que conduz o pensamento. A rigor, “a virtude dos talismãs, de qualquer natureza que sejam, jamais existiu, senão, na imaginação das pessoas crédulas.”(4) Deste modo, não há nenhuma palavra sacramental, nenhum sinal cabalístico, nenhum talismã que tenha qualquer ação sobre os Espíritos, porque eles são atraídos somente pelo pensamento e não pelas coisas materiais.

A realidade é que “a natureza do Espírito atraído terá afinidade com a pureza da intenção e da elevação dos sentimentos; porém, obviamente, quem assenta fé na virtude de um talismã tem um intento mais material do que moral, isso denota em muitos casos uma inferioridade e fraqueza de ideias que o expõem aos Espíritos imperfeitos e zombeteiros.”(5) Os Instrutores espirituais, em todos os tempos, condenaram o emprego de sinais e das formas cabalísticas, e todo [encarnado ou desencarnado] que lhes atribui uma virtude qualquer, ou pretenda valorizar talismãs que tangem para a magia, revela, com isso, sua inferioridade, esteja agindo de boa fé ou por ignorância.

Não negamos a relativa influência oculta de certos objetos de uso pessoal (joias, por exemplo) que parecem funestos magneticamente. Emmanuel explana que os objetos, principalmente de uso pessoal, “têm a sua história viva e por vezes, podem constituir o ponto de atenção das entidades perturbadas, de seus antigos possuidores no mundo; razão porque parecem tocados, por vezes, de singulares influências ocultas, porém, nosso esforço deve ser o da libertação espiritual, sendo indispensável lutarmos contra os fetiches, para considerar tão somente os valores morais do homem na sua jornada para o Perfeito.”(6)

Os Espíritos que aconselham sinais, palavras extravagantes ou receitam determinadas fórmulas secretas são seres primários que caçoam e brincam com a ingênua credulidade dos incautos. Há pessoas que atribuem poderes nas defumações domésticas a fim de afastar os “maus” espíritos do lar, será isso eficaz? Obviamente, não! Quando muito a fumaça poluirá a atmosfera e, quem sabe!

Espante algumas muriçocas e carapanãs, mas quanto aos obsessores, não haverá qualquer efeito. A fuligem defumatória tão somente sinalizará aos espíritos zombeteiros que em tal ou qual moradia residem crendices e superstições, portanto, ambiente fértil e facilmente influenciável por eles. Portanto, não exercendo qualquer controle sobre os Espíritos [bons ou maus], a defumação é completamente ineficaz para suposta proteção da influência dos Espíritos.

Kardec adverte que “não há [qualquer força sobrenatural], para alcançar esse [ou aquele] objetivo, nem palavras sacramentais, nem fórmulas, nem talismãs, nem quaisquer sinais materiais [riscados, cantados, defumados, fitas do Senhor do Bonfim etc]. Os maus Espíritos disso se riem e se alegram frequentemente em indicarem [tais apetrechos]. [Tais seres zombeteiros] sempre têm o cuidado de se dizer infalíveis, para melhor captar a confiança daqueles que querem enganar, porque então estes confiantes na virtude do procedimento, se entregam sem medo.”(7)

Por razões lógicas o Espiritismo não adota e nem usa em suas reuniões e em suas práticas: altares, imagens, andores, velas, procissões, sacramentos, concessões de indulgência, paramentos, bebidas alcoólicas ou alucinógenas, incenso, fumo, talismãs, amuletos, horóscopos, cartomancia, pirâmides, cristais, búzios ou quaisquer outros objetos, rituais ou formas de culto exterior. Até porque os Espíritos são atraídos somente pelo pensamento; portanto, nenhum talismã, amuleto, palavra sacramental, sinal cabalístico ou qualquer tipo fórmula exterior poderá exercer qualquer influência sobre eles.

Respeitamos os que creem na influência dos talismãs da felicidade pessoal, porém somos convidados a informar que o talismã para a felicidade pessoal, definitiva, se constitui de um bom coração sempre afeito à harmonia, à humildade e ao amor, no integral cumprimento dos desígnios de Deus.

 

Jorge Hessen

 
Referência bibliográfica:

(1) Disponível em http://mistico.com/p/talisma/ acesso em 23/08/13

(2) Kardec, Allan. O Livro dos Médiuns, 2ª parte, cap. XXV, item 282-17ª, Rio de Janeiro: Ed FEB, 1991

(3) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, perg. 555, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1994

(4) Kardec, Allan. O Livro dos Médiuns, 2ª parte, cap. XXV, item 282-17ª, Rio de Janeiro: Ed FEB, 1991

(5) Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, perg. 553 e 554, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1994

(6) Xavier, Francisco Cândido. O Consolador, ditado pelo Espírito Emmanuel, perg. 143, Rio de janeiro: Ed. FEB, 1997

(7) Kardec, Allan. Revista Espírita, dezembro de 1862, Brasília: Ed. Edicel, 2002

domingo, 22 de setembro de 2013

PERTURBAÇÃO ESPIRITUAL


 
- A alma tem consciência de si mesma imediatamente após deixar o corpo?

- Imediatamente não é bem o termo.  A alma passa algum tempo em estado de perturbação:

(Questão n" 163 de "O Livro dos Espíritos")

 

 

Só pelo estudo criterioso da Doutrina dos Espíritos, através do ângulo filosófico, é que podemos, na verdade, compreender alguns curiosos acontecimentos relacionados com o Mundo Espiritual. A pergunta formulada por Kardec aos Espíritos Reveladores, por isso, é de suma importância, uma vez que, sobre o assunto, são múltiplas as interpretações.

A resposta dada, embora das mais simples, esclarece sobejamente, explicando o que acontece ao Espírito, ao ensejo da desencarnação, momento em que se defronta com o problema chamado “perturbação espiritual”.

Meditando na solução dada à questão nº 163 e às que se seguem, somos levados a admitir a existência de três fases distintas no desdobramento do trabalho de elucidação do Espírito recém-desencarnado:

 

1ª fase - Busca da Identidade - A primeira preocupação reside no ingente esforço de reavivar a memória, traumatizada com o acelerar víbratórío decorrente da ausência do corpo. Esse trabalho é de variável tempo de duração, tudo dependendo da maior ou menor condição de desmaterialização do Espírito. O tempo pode ser de horas ou de anos. Em se tratando de Espírito que tenha vivido como um homem de bem e que já tenha alcançado apreciável índice de progresso espiritual, o estado de perturbação é passageiro, permitindo a lembrança de sua identidade sem maiores delongas.

Nas reuniões de intercâmbio frequentemente nos defrontamos com Espíritos aflitos, totalmente desprovidos de memória, que não se recordam, sequer, dos seus próprios nomes. São aqueles que conduzem as consciências repletas de inquietações e remorsos, não dispondo, consequentemente, da necessária serenidade para a reflexão.

 

2ª fase - Reconhecimento do Local - Os que estão presos às tradicionais interpretações religiosas esperam, com a “morte”, o acesso às esferas das bem-aventuranças ou às torturas sem fim, onde há “fogo que não consome”.

Aos seus olhos tudo se esboça de maneira diversa. Encontra vida movimentada, atuante, febril, com atividade intensa e continuada, e isso os surpreende. Com o tempo e o esforço de adaptação, entretanto, os Espíritos vão-se convencendo de que Céu e Inferno, efetivamente, não passam de estados de consciência, jamais existindo como regiões específicas. No Espaço, portanto, ou melhor dizendo, na erraticidade, é que vão efetivando o esforço de aperfeiçoamento intelectual e moral, preparatório para futuras encarnações, observadas as leis de Afinidade e de Causa e Efeito.

 

3ª fase - Providências Necessárias- Quando seja possível aos Espíritos vencerem as duas primeiras fases, isto é, lograrem sua identidade e reconhecerem o local em que se encontram, é que poderão atacar a terceira etapa, ou seja, aquela relacionada com as medidas indispensáveis para o prosseguimento da caminhada evolutiva.

É nessa hora que vão prevalecer todas as elucidações doutrinárias obtidas através do estudo metódico e criterioso das obras básicas de Kardec, nas quais a Doutrina dos Espíritos é profundamente analisada pelos ângulos moral, filosófico e científico.

Cada Espírito reconhecerá, então, encontrar-se no Espaço ilimitado, onde prosseguirá no trabalho corajoso de emancipação do erro, através da assimilação dos ensinos superiores de ordem moral e intelectual. E saberá, decorrentemente, que o trabalho profícuo e o desinteresse integral pelas coisas materiais serão as poderosas armas a adotar para o combate às milenárias imperfeições que o classificam em baixo nível de progresso espiritual.

Reconhecendo tais imperativos, cabe-nos proceder com as maiores cautelas, enquanto estamos na carne, colocando-nos sempre como candidatos potenciais para a vida no mundo etéreo, habilitando-nos para essa transição, de modo a que a fase normal de perturbação não seja cruel para conosco, mas que, isso sim, em razão de nossos conhecimentos doutrinários e de nossa conduta evangélica, possamos amenizar as inquietações e os sustos dessa hora difícil.

 

Arthur da Silva Araújo 

‘Brasil Espírita’ (FEB) Jan 1971

sábado, 21 de setembro de 2013

O ESPIRITISMO AMPARA E ORIENTA SEMPRE


 
O Espiritismo desempenha importantíssimo papel na vida humana, pela facilidade que oferece à intercomunicação do mundo invisível com o mundo físico. Sua Doutrina, simples, confortadora e compreensível, esclarece, orienta, educa e ampara a criatura humana através das complexidades terrenas. Estabelece ambiente propício ao intercâmbio de ideias entre os dois mundos, favorecendo o trabalho mútuo, regulando e dando aos homens a ajuda ostensiva dos Espíritos, ao mesmo tempo que a estes faculta a contribuição dos trabalhadores terrícolas.

Não é assim que procedem alguns credos superados pelos preconceitos que criaram, ao se escravizarem dogmaticamente ou descontrolados por ambições mundanas e políticas. O Catolicismo, por exemplo, proíbe a comunicação do mundo físico com o mundo espiritual, proibição estulta e inútil. Um católico que perde qualquer pessoa da família ou de suas relações mais afetivas está impedido de senti-la perto de si. Para o Catolicismo, morreu, acabou. Não se fala mais nisso, salvo em missas ao preço da tabela. É desdobrar sobre aquele que desencarnou o manto do esquecimento, que significa ingratidão e desamor, e pensar em outra coisa. No Espiritismo, não. Nós não cultivamos morbidamente os mortos, porque os sabemos tão vivos quanto nós, embora não revestidos do corpo carnal. Nós cultivamos o Espírito e por isso compreendemos que o ambiente espírita favorece a manutenção do sentimento de amor que não é rompido pela morte. O Espírito a ela sobrevive e busca as reuniões espíritas na esperança de suavizar as saudades daqueles a quem amaram na Terra. Portanto, o Espiritismo não sufoca esse sentimento afetivo, tão útil à evolução moral da criatura humana: conserva-o, consolando simultaneamente os Espíritos, esclarecendo-os e ajudando-os a compreender o novo estado a que chegaram a obediência a inelutáveis leis de Deus.

O Catolicismo procede de modo inverso, pondo uma barreira de intransigência entre os dois mundos, evitando de todas as maneiras que o Espírito possa consolar-se da separação verificada com a perda do corpo somático e proibindo, à criatura ferida pela dor de ver partir para o Além um parente ou um amigo, que busque o lenitivo que o Espiritismo oferece e dá. O mais que o Catolicismo apresenta é uma promessa sombria de purgatório e inferno, porque o prêmio da vida contemplativa no céu, essa ideia absurda que a teologia cristã herdou do paganismo, só existe para um número muito reduzido de crentes.

Se outras diferenças fundamentais não houvesse, demonstrando a superioridade doutrinária do Espiritismo sobre o Catolicismo, esse fato - o da intercomunicação de encarnados e desencarnados - serviria de exemplo do quanto a nossa Religião atende mais ao sentimento afetivo da criatura humana, aproximando o que a morte distanciou, permitindo entendimentos e contatos que atenuam o sofrimento da separação provocada pela morte. Graças ao Espiritismo, essa morte não é absoluta, porque podem os chamados mortos comunicar-se com os vivos. Geralmente, depois de desencarnar, o Espírito anseia por voltar à companhia de parentes e amigos, frequentando os lugares a que se habituara quando encarnado. Em vez de o Espiritismo persegui-lo, desprezá-lo, escorraçando-o friamente, recebe-o com bondade, esclarecendo-o, buscando confortá-lo e reduzir suas aflições, assim como assiste e ampara os encarnados, consolando-os em virtude da ausência física dos entes amados que transpuseram a imaginária fronteira do Além. O Catolicismo, que persegue o Espiritismo e os espíritas, não respeita os sagrados sentimentos da criatura humana, impondo-lhes atitudes que não condizem com a caridade cristã, e rechaça os desencarnados, em vez de ampará-los, quando mais sofrem as consequências da separação material. O Espiritismo dá conforto e favorece a reaproximação consoladora, ao mesmo tempo que, por sua Doutrina, opera a elucidação gradual das duas partes, sobre a natureza da vida física, a razão da morte, a vida depois do abandono do corpo carnal. Os que foram e os que ficam aprendem a razão de todas essas coisas e passam a encará-las -com uma serenidade exemplar, adotando a atitude mais razoável em cada caso.

O Espiritismo não força, persuade pela razão dos próprios fatos e pelo poder da sua Doutrina de paz, amor e caridade. Não estimula a credulidade fácil, pois não deseja que ninguém abdique a liberdade de raciocinar e julgar por si mesmo o que vê, sente, observa e analisa. O Espiritismo não quer autômatos nem fanáticos, que creiam sem compreender no que creem. Esta é outra diferença profunda que há entre o Espiritismo e o Catolicismo.

Léon Denis, em "No Invisível", um de seus magníficos livros, chama-nos a atenção para este pormenor importante: "As revelações de além-túmulo são concordes em um ponto capital: depois da morte, como no vasto encadeamento de nossas existências, tudo é regulado por uma lei suprema." E acrescenta: "Com o Espiritismo, coração e razão, tudo tem sua parte. O círculo dos afetos se dilata. Sentimo-nos melhor amparados na prova, porque aqueles que em vida nos amavam, nos amam ainda além do túmulo e nos ajudam a carregar o fardo das misérias terrestres. Não estamos deles separados senão em aparência. Na realidade, os humanos e os invisíveis caminham muitas vezes lado a lado, através das alegrias e das lágrimas, dos êxitos e reveses. O amor das almas que nos são diletas nos envolve, nos consola e reanima. Cessaram de nos acabrunhar os terrores da morte." (Capítulo XI - Aplicação moral e frutos do Espiritismo, ob. cit.)

 

Boanerges das Rocha (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Nov 1958

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A HORA CRUCIAL DO TESTEMUNHO


É muito fácil e agradável viver teoricamente o Espiritismo, usufruir as alegrias do contato intermitente nos Centros Espíritas e nas reuniões determinadas para ouvir oradores vibrantes e ardentes, cujo talento e imaginação são postos a serviço da difusão do Espiritismo. É muito interessante ler artigos bem arquitetados, em estilo primoroso e farto de frases ricas de conteúdo e belas em sua forma. É uma festa para o coração a oportunidade de encontrar correligionários e amigos, externando o encanto da fraternidade tão recomendada pelos Evangelhos, ainda que isso ocorra ocasionalmente. Tudo muito fácil, quando se repetem os ensinamentos de Jesus e as recomendações de Allan Kardec; as belezas das sentenças evangélicas comentadas por J. B. Roustaing, as maravilhas contidas nos conceitos de Emmanuel, de André Luiz, Irmão X, etc. É muito estimulante ler e relembrar os grandes escritores do Espiritismo, como Léon Denis, Gabriel Delanne, além das obras devidas à mediunidade de Chico Xavier, Divaldo Franco, Yvonne Pereira, Zilda Gama, etc.

Tudo isso nos faz bem à alma, enriquece a nossa cultura espírita e alegra os nossos dias. Entretanto, todo esse acervo de conhecimentos, toda essa gama de contatos amigos, a imensa colheita de afetos que se nos oferece em cada oportunidade, representam uma responsabilidade enorme para o nosso espírito, pela obrigação que nos impõem ao testemunho sério e inevitável nos dias futuros, no amanhã inexorável que nos espera.

Se não tivermos aproveitado todos esses momentos para fortalecermos o espírito com a aquisição sincera e sólida da fraternidade, do amor que a amizade representa, de nada vale a bagagem que consciente ou inconscientemente tenhamos preparado. Há um determinado dia, à espera de cada um de nós, no qual teremos de demonstrar o valor da carga que trouxemos. Se ela representa apenas o resultado de uma vida de relação meramente convencional, ou se, pelo contrário, está valorizada pelo sentimento afetivo que deve realmente marcar as relações entre os profitentes do Espiritismo, mais comprometidos com Jesus do que pensam. Por isso, recordamos esta passagem de II Coríntios, 13:5: "Examinei-vos a vós mesmos, se permaneceis na fé; provai-vos a vós mesmos." - Paulo.

Foram considerações dessa ordem que nos assaltaram a alma, quando estivemos em face de provações que nos pareceram perto da fronteira. Reexaminamos o nosso comportamento no passado, rememoramos erros cometidos e posteriormente evitados, tanto quanto nos permite o nível espiritual apagado em que nos achamos. Fizemos uma "autópsia" das ideias que nos têm ocorrido no curso da existência e experimentamos um contentamento sadio, ao nos aproximarmos da época em que fomos trazidos ao Espiritismo. Recordamos a mão que nos estendeu Ignácio Bittencourt, por seu exemplo abnegado; revivemos a ajuda que nos deram amigos, hoje do outro lado da Vida, honestamente empenhados de nos ver na estrada que conduzia ao Cristo; ressentimos a mão de Wantuil de Freitas e a palavra de Manuel Quintão, a nos oferecerem posição estável na senda espírita, contribuindo, assim, para consolidar a opção que havíamos feito.

Estávamos quase defrontando a hora crucial do testemunho, embora ela ainda não chegasse, como supúnhamos. A advertência de André Luiz nos aflorou à mente: "Nos cometimentos, identificar a Vontade Superior, promovendo em toda parte a segurança e a felicidade das criaturas. Cada coração humano é uma peça de luz potencial e Jesus é o Sublime Artífice." Não esquecemos que Ele é a Luz do Mundo e que "o acatamento é prece silenciosa", frase também de André Luiz.

A hora crucial do testemunho, se soubermos aproveitá-la, muito nos aliviará e provará a Deus o que somos na verdade, o que na verdade aprendemos e o que verdadeiramente poderemos fazer no momento decisivo. Que sejamos dignos do Espiritismo, para que possamos honrar as bênçãos que sempre são dadas por misericórdia do Alto. A nada mais aspiramos.

 

Indalício Mendes

Reformador (FEB) Abril 1978

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

“A LUZ DA VERDADE”




"Vendo Jesus Natanael aproximar-se, disse dele: eis um verdadeiro israelita, em quem não há fingimento!' Perguntou-lhe Natanael : 'Donde me conheces?' Respondeu Jesus: Antes de Filipe chamar-te, eu te vi,quando estavas debaixo da figueira'. Replicou-lhe Natanael:'Rabbi, tu és o Filho de Deus, tu és o Rei de Israel'! Disse-lhe Jesus: 'por dizer-te que te vi debaixo da figueira, crês? Verás coisas maiores que estas' ...E acrescentou: Em verdade, em verdade vos digo, que vereis o céu aberto e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o filho do homem" (João. I: 47-51).

Inaldo, combativo confrade espírita, na abençoada tarefa de divulgar o Consolador prometido pelo Cristo de Deus, vens, em À Luz da Verdade, com excelente didática, focar luz, na sempre atual problemática em torno da magnífica obra mediúnica, Os Quatro Evangelhos, compilada pelo missionário de Bordeaux, Jean Baptiste de St. Omer Roustaing.

Inaldo, um verdadeiro espírita, em quem não há fingimento, à semelhança do escolhido israelita Natanael (Bartolomeu), sentastes à meditar debaixo da figueira frondosa da revelação da Revelação, que os espíritos Evangelistas, assistidos pelos Apóstolos e Moisés, através da médium Émilie Aimée Charlotte Bréard Collignon, em espírito e verdade, iluminaram a Terceira Revelação, que o sábio Allan Kardec teve a missão de codificar.

Inaldo, agasalhado pelo propósito espírita do instruí-vos; após ler, reler e muito meditar sobre tudo que se publicou, contra e a favor, de Os Quatro Evangelhos, e com a proteção inestimável dos amigos espirituais, os anjos de Deus, - que subindo e descendo sobre os filhos dos homens, realizam a sagrada missão de esclarecer e confortar -, conseguistes, Inaldo, visualizar os céus abertos, o paroket do mistério crístico rasgado, perante seus olhos, olhos de ver; e, decifrastes o espírito da Nova Revelação.

Inaldo, tomado de inconformação, a inconformação dos que conhecem mais, mas sabem que serão cobrados pela guarda e multiplicação dos talentos recebidos; tomado ainda, pelo outro propósito espírita, do amai-vos, colocastes todas as suas iluminadas reflexões no papel e nos legastes À Luz da Verdade, um livro urgente, conciso e arquitetado em pinceladas de saborosa inteligência.

Inaldo, aqui queremos nos afastar dos prefácios que mais envernizam que contribuem e, também, com sua licença, apresentar verdades, verdades que corroboram em acentuar o papel histórico de Roustaing e sua Obra, como colunas do Espiritismo, no seu aspecto de Evangelho Redivivo.

Assim, à luz da verdade, temos:

 

*          Em 1861 Allan Kardec indicou o Grupo Espírita do Sr. Sabó, dirigido espiritualmente por Fénelon, para Roustaing receber as primeiras orientações sobre a nova Doutrina.

*          Na Revue, em 1861, Kardec felicita Roustaing pelas interpretações de mensagens mediúnicas por ele estudadas, e chega a afirmar que Roustaing passou a mestre na tarefa de interpretar.

*          Quando da visita de Kardec a Cidade progressiva de Bordeaux, no final de 1861, entre tantos discursos, o médico e escritor, Dr. Bouché de Vitray, afirma perante o eminente Codificador: "O Sr. Roustaing ... destinado a representar papel marcante nos fatos do Espiritismo".

*          Em janeiro de 1862, a Sra. Collignon passa a frequentar o Grupo do Sr. Sabó.

*          Em 1864 e 1865, Kardec saúda duas brochuras de Collignon, Conselhos às Mães de Família e Palestras Familiares sobre o Espiritismo, com palavras mais que elogiosas.

*          Em 1866, Kardec comenta o lançamento de Os Quatro Evangelhos, com entusiasmo, e escreve que não há nada nele que contradiga O Livro dos Espíritos e O livro dos Médiuns.

*          Em 1867, em A Gênese, o Codificador registra a sua opinião pessoal, sobre a verdade do corpo fluídico, ensinada em espírito verdadeiro, por Roustaing. Escreve que não é impossível sua existência à luz da verdade espírita; porém, deixava a confirmação pelos espíritos, no futuro.

*          Em 1870, a obra Os Quatro Evangelhos podia, também, ser adquirida na Sociedade Para a Continuação das Obras de Allan Kardec; Sociedade idealizada pelo Codificador e fundada por sua fiel esposa, a Sra. Rivail. Os pedidos deveriam ser encaminhados para o Gerente da Livraria Espírita, M. Bittard .

*          De 1869 a 190 I, Pierre-Gaetan Leymarie, o grande administrador da Sociedade e redator-chefe e diretor da Revue Spirite, foi um grande estudioso, defensor e divulgador das ideias as propaladas por Roustaing. Há dezenas de comentários seus, nesse sentido, na Revue.

*          Em 1882, quando da 2ª tiragem de Os Quatro Evangelhos, em sua folha de rosto, há o registro, que em Paris o livreiro dessa obra, era a Sociedade fundada por Allan Kardec. Naquela época o endereço da Sociedade era: Rue des Petits Champs.

*          A obra de Roustaing chegou ao Brasil (1870) através do pioneiro Luís Olímpio Teles de Menezes, fundador do 1º grupo e periódico espíritas, em nossa pátria, em 1865 e 1869, respectivamente.

*          Em 1873, o 1º grupo espírita na capital do Império, o Grupo Confúcio, estudava, com entusiasmo, Os Quatro Evangelhos.

*          Em 1880, o Grupo Ismael, com Sayão, Bittencourt, Bezerra, Frederico Silva e outros, estudava sistematicamente a obra de Roustaing.

*          Em 1883 surge o Reformador, atualmente a mais antiga e ininterrupta revista de divulgação do Espiritismo. O Reformador sempre priorizou propagar o binômio espírita Kardec- Roustaing.

*          Em 1884, o Plano Maior, materializa no Brasil, a Federação Espírita, que já nasceu agasalhando a mensagem de Roustaing.

*          Em 1887, Max (Bezerra de Menezes) começa sua série de artigos espíritas, em jornais leigos, por dez anos. O Paiz, O Jornal do Brasil e A Gazeta de Notícias estamparam, por diversas vezes, de forma clara e destemida, matérias elucidando o pensamento de Roustaing, que para Bezerra, era pouco acessível às inteligências de certo grau para baixo.

*          Em 1889, Bezerra de Menezes assume a presidência da FEB e se encarrega de transferir o Grupo Ismael (com seu programa doutrinário) para ser a célula espiritual da Federação.

*          Em 1895, Bezerra assume com plenos poderes a direção da Federação e inclui, imediatamente, Os Quatro Evangelhos no Estatuto da Casa de lsmael. Esta atitude formal foi um fortalecimento do estado de fato

 

            

*          Em 1898, Bezerra começa a publicar a tradução de Os Quatro Evangelhos, no Reformador, feita pelo Marechal F. R. Ewerton Quadros, 1º presidente da Federação.  Ainda nesse ano, temos o lançamento do mavioso Jesus Perante a Cristandade, que abraça as verdades de Roustaing, do Espírito Bittencourt Sampaio, pelo médium Frederico Silva. O grande fato foi a imprensa leiga reconhecer o puro e verdadeiro estilo que da outra vida veio, firmado pelo próprio Bittencourt Sampaio.

*          Em 1903 surge o elucidativo A Personalidade de Jesus, que estuda Roustaing, de Leopoldo Cirne, o substituto de Bezerra de Menezes, nas tarefas da Federação.

*          Em 1909, a Federação lança a definitiva tradução de Roustaing, feita por Guillon Ribeiro. Foi Guillon o tradutor das obras de Kardec, publicadas pela FEB, as mais vendidas, e colaborador de Ruy Barbosa no trabalho de revisão do Projeto do Código Civil.

*          Em 1926 começa ostensivamente as atividades mediúnicas de Yvonne A Pereira, um dos principais médium do Espiritismo. É Yvonne estudiosa de Roustaing e sua obras retratam os ensinos da revelação da Revelação.

*          Em 1931 se projeta para o mundo a mediunidade missionária de Francisco Cândldo Xavier, um autêntico estudioso e defensor das ideias de Roustaing.

*          De 1932 começa a brilhar A Grande Síntese, que brotou através da maior antena psíquica de nosso século, o apóstolo do Cristo, Pietro Ubaldi. Nesta obra, Cristo volta para renovar seus ensinamentos no Mar da Galileia e, entre tantos outros pontos, de comum acordo com Roustaing, foca, que num futuro biológico, usaremos corpos ectoplasmáticos, conforme o de Jesus, quando entre nós. Ainda, em 1932, a médium América Delgado capta o espírito Guerra Junqueiro, que confirma, em Funerais da Santa Sé: Jesus não foi jamais involucrado em lama!

*          Em 1936, Antônio Lima nos oferece A Vida de Jesus. Emmanuel, através da pena de Chico Xavier, registra no elucidativo prefácio: "Os homens devem saber que o Missionário Divino não viveu a mesma lama de suas existências ... Que a família genuinamente cristã .,. pratique largamente sua doutrina, esperando, com a humildade requerida, o tempo propício à compreensão de determinadas verdades ..."

*          Em 1937, temos uma bela definição de Pietro Ubaldi, em Ascese Mística: Jesus é o fato tangível e inegável em que o super sensível se materializou.

*          Em 1938 aparece o maravilhoso Brasil Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, do espírito Humberto de Campos, pelo Chico Xavier, que informa: - em se tratando do Espiritismo, Roustaing organizaria o trabalho da fé.

*          Em 1939 refulge a mediunidade de Zilda Gama, que lendo o pensamento do espírito Victor Hugo, em Dor Suprema, revela que Jesus possuía como que uma clâmide materializada a revestir-lhe o corpo sideral.

*          Na Páscoa de 1945, Pietro Ubaldi entrega ao mundo A Nova Civilização do Terceiro Milênio, que sem rodeios, assevera que Francisco de Assis, espiritualmente distante da evolução cósmica do Cristo, foi o máximo que a biologia humana conseguiu suportar.

*          De 1948 se destaca Elos Doutrinários, de Ismael Gomes Braga. Nele encontramos sábios apêndices, do erudito amigo Zêus Wantuil e, entre eles, temos Os Docetas, Precursores do Espiritismo. Chico Xavier, estudioso e sincero, escreve para Antônio Wantuil: Li o trabalho de Zêus, referente ao Docetismo ... estou encantado.

*          Em 1949, temos no dia 05 de outubro a concretização do sonho do inesquecível Bezerra de Menezes: a assinatura do Pacto Áureo. Com relação a Roustaing a FEB esclarece: é obrigatório o estudo da obra de Roustaing? - Para nós (FEB) sim, para as adesas não.

*          Em 1952 temos um fenômeno extraordinário! O espírito Bezerra de Menezes assina, como quando entré nós, pela mediunidade de Chico Xavier, o novo Estatuto do Grupo Espírita Regeneração, no Maracanã, Rio de janeiro, que observa o estudo sistemático de Roustaing, conforme sua primeira página.

*          Em 1968, no dia 06 de Outubro, Divaldo Franco, o ilustre confrade baiano, em emocionante palestra, no Grupo Espírita Fabiano, no Rio de janeiro, narra o que todos já sabíamos: Eu fui a Roustaing, que é minha fonte inexaurível de estudos evangélicos! Há quase vinte anos que eu leio o benfeitor João Batista Roustaing.

*          Em 1970, Pietro Ubaldi conclui sua magnífica obra de 24 Vol., com o incomparável Cristo. Nele, Ubaldi derrama toda a sua sabedoria, amadurecida pelos irmãos tempo e sofrimento; e, como não podia deixar de ser, em comum acordo com o pensamento de Roustaing, explica a necessidade da evolução de Jesus, através dos reinos infra-humanos e espiritual consciente, sem falir, rumo a perfeição sideral.

*          Em 1979 Francisco Thiesen e Zêus Wantuil, legam ao movimento espírita, a biografia de fôlego de Allan Kardec, em 03 volumes; e, numa harmonia perfeita com a vida e obra do grande Codificador, citam Roustaing 19 vezes e Collignon 07.

*          Em 1999, mais um grande evento em torno de Os Quatro Evangelhos. A Casa de Recuperação e Benefícios Bezerra de Menezes, em Botafogo, Rio de janeiro, inaugura, sua page na Rede Mundial de Informações, a Internet, com o endereço: http://www.casarecupbenbm.org.br.

Nesse site encontramos uma inovação genial: A Praça Allan Kardec e o Museu Virtual Roustaing.

 

Vale Conferir!

Inaldo, À Luz da Verdade ( e só citamos alguns fatos) vemos que a História do Espiritismo, no que de há de mais positivo, conspira em favor de Roustaing e de sua monumental compilação, Os Quatro Evangelhos, que tanto lemos, estudamos, admiramos e divulgamos.

Jorge Damas Martins

 Prefácio do livro  “À Luz da Verdade” de Inaldo Lacerda Lima (SODEAS Editora Auta de Souza, 2000)

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

INTRODUÇÃO - LIVRE ARBÍTRIO


 
 
A questão do livre arbítrio é uma das mais importantes na vida do ser humano encarnado ou desencarnado.

- O que fazer de si próprio? Como empregar o tempo, que passa e não volta mais? Como proceder em relação aos outros? O que pensar em relação a uma série de temas decisivos na própria vida do dia a dia e naqueles outros tidos como “abstratos”? Acreditar que é um Espírito ou que é meramente um corpo destinado à sepultura?

São inúmeras perguntas que cada um tem de responder, caso queira ser consciente do próprio rumo, ou, em caso contrário, viver simplesmente se atordoando com atividades ou com a ociosidade, fugindo de si mesmo.

A decisão a esse respeito é individual, intransferível, sendo que “a cada um será dado conforme suas obras”, aí incluído tudo que cada um fez de si mesmo.

Este livro não se propõe impor a ninguém um “ponto de vista”, mesmo que saibamos ser o verdadeiro, mas sim trazer ao grande público conhecedor das verdades da reencarnação, da evolução, da pluralidade dos mundos habitados e outras questões desse nível, uma reflexão sobre dois temas de vital importância na vida de cada ser humano, que são: 1 – o livre arbítrio e 2 – o mérito.

Os prezados leitores, ao final da leitura, verificarão que sabem muito pouco sobre o livre arbítrio, pois os filósofos materialistas, aqueles que trataram ou tratam do assunto, dão-lhe um elastério praticamente infinito, o que não corresponde à verdade, enquanto que o mérito tem sido tratado como recompensa destinada àqueles ainda dominados por uma índole muitas vezes agressiva, astuta ou egoísta.

Ninguém, em sã consciência, depois de ler esta obra, continuará a ter dúvidas sobre esses dois temas, porque, pura e simplesmente, quem estará dando as respostas será o próprio Divino Mestre Jesus, Sublime Governador da Terra, através do seu livro pouco conhecido atualmente, apesar de já quase centenário, intitulado “A Grande Síntese”, ditado através do médium Pietro Ubaldi, atualmente já desencarnado, livro esse que muita repercussão encontrou na época, tendo sido compulsado por Albert Einstein e outros luminares da intelectualidade, mas, com o tempo, acabou quase que caindo no esquecimento.

Propomo-nos a comentar, em breves palavras, aquilo que encontramos nesse precioso resumo de todo o Conhecimento Humano possível para o ser humano encarnado da primeira metade do século XX e que o próprio Sublime Governador da Terra trouxe para Seus pupilos terrenos, através da mediunidade de um missionário que encarnou com essa tarefa específica.

Emmanuel, através da mediunidade de Chico Xavier, atestou a origem dessa obra gigantesca como sendo de autoria do próprio Jesus, o que não é de se espantar, porque, se Ele tem se manifestado inúmeras vezes aos homens e mulheres cuja tarefa é contribuir para o progresso da humanidade encarnada, por que não poderia, através de um médium, ditar uma obra, como o fazem Seus mensageiros, dentre os quais Emmanuel, Bezerra de Menezes etc. etc.?

Para iniciar nosso estudo sobre esses dois temas, transcreveremos, sem nenhum comentário, porque desnecessário, o diálogo entre Jesus, quando Encarnado, e o senador Públio Lentulo, ou seja, o próprio Emmanuel, descrito por este último, no seu livro “Há Dois Mil Anos”, psicografado por Chico Xavier.

Ali vemos o livre arbítrio do Espírito encarnado ser respeitado integralmente, conforme acontece sempre, pois os Espíritos Superiores nunca obrigam seus pupilos a optarem pelo Bem, mas apenas lhes aconselham essa opção, deixando por conta do aluno as escolhas, a fim de ele que tenha o mérito dos bons resultados.

Temos de aprender essa lição para a nossa vida, pois, ainda, no geral, tendemos muito a impor nossas vontades, mesmo que informadas de boas intenções, a todos aqueles a quem amamos e, principalmente, aos que ainda não amamos, sem saber que, com isso, estamos agindo incorretamente, demonstrando atraso espiritual, o qual precisa ser superado para evoluirmos, além de prejudicar aqueles a quem temos o dever de ensinar, sobretudo, pela exemplificação e pouco pelas palavras, pois “se a palavra convence, o exemplo arrasta”.

Não que se vá optar pela omissão, que é um erro grave, mas que aprendamos a respeitar o livre arbítrio alheio, para que cada um daqueles que cruzar o nosso caminho, “por um pouco de tempo”, receba, na própria vida, os galardões que merecer pelas suas boas “obras”.

Passemos, então, à dramática, mas sublime lição vivida por Emmanuel há dois milênios atrás:

Após haver percorrido uns trezentos metros de caminho, encontrou transeuntes e pescadores, que se recolhiam e o encaravam com mal disfarçada curiosidade.

Uma hora passou sobre as suas amargas cogitações íntimas.

Um velário imenso de sombras invadia toda a região, cheia de vitalidade e de perfumes.

Onde estaria o profeta de Nazaré naquele instante? Não seria uma ilusão a história dos seus milagres e da sua encantadora magia sobre as almas? Não seria um absurdo procurá-lo ao longo dos caminhos, abstraindo-se dos imperativos da hierarquia social? Em todo caso, deveria tratar-se de homem simples e ignorante, dada a sua preferência por Cafarnaum e pelos pescadores.

Dando curso às ideias que lhe fluíam da mente incendiada e abatida, Públio Lentulus considerou dificílima a hipótese do seu encontro com o mestre de Nazaré.

Como se entenderiam?

Não lhe interessara o conhecimento minucioso dos dialetos do povo e, certamente, Jesus lhe falaria no aramaico comumente usado na bacia de Tiberíades.

Profundas cismas entornavam-lhe do cérebro para o coração, como as sombras do crepúsculo que precediam a noite.

O céu, porém, àquela hora, era de um azul maravilhoso, enquanto as claridades opalinas do luar não haviam esperado o fechamento absoluto do leque imenso da noite.

O senador sentiu o coração perdido num abismo de cogitações infinitas, ouvindo-lhe o palpitar descompassado no peito opresso.

Dolorosa emoção lhe compungia agora as fibras mais íntimas do espírito.

Apoiara-se, insensivelmente, num banco de pedras enfeitado de silvas, deixara-se ali ficar, sondando o ilimitado do pensamento.

Nunca experimentara sensação idêntica, senão no sonho memorável, relatado unicamente a Flamínio.

Recordava-se dos menores feitos da sua vida terrestre, afigurando-se-lhe haver abandonado, temporariamente, o cárcere do corpo material.

Sentia profundo êxtase, diante da Natureza e das suas maravilhas, sem saber como expressar a admiração e reconhecimento aos poderes celestes, tal a clausura em que sempre mantivera o coração insubmisso e orgulhoso.

Das águas mansas do lago de Genesaré parecia-lhe emanarem suavíssimos perfumes, casando-se deliciosamente ao aroma agreste da folhagem.

Foi nesse instante que, com o espírito como se estivesse sob o império de estranho e suave magnetismo, ouviu passos brandos de alguém que buscava aquele sítio.

Diante de seus olhos ansiosos, estacara personalidade inconfundível e única. Tratava-se de um homem ainda moço, que deixava transparecer nos olhos, profundamente misericordiosos, uma beleza suave e indefinível. Longos e sedosos cabelos molduravam-lhe o semblante compassivo, como se fossem fios castanhos, levemente dourados por luz desconhecida. Sorriso divino, revelando ao mesmo tempo bondade imensa e singular energia, irradiava da sua melancólica e majestosa figura uma fascinação irresistível.

Públio Lentulus não teve dificuldade em identificar aquela criatura impressionante, mas, no seu coração marulhavam ondas de sentimentos que, até então, lhe eram ignorados. Nem a sua apresentação a Tibério, nas magnificências de Capri, lhe havia imprimido tal emotividade ao coração.

Lágrimas ardentes rolaram-lhe dos olhos, que raras vezes haviam chorado, e força misteriosa e invencível fê-lo ajoelhar-se na relva lavada em luar.

Desejou falar, mas tinha o peito sufocado e opresso. Foi quando, então, num gesto de doce e soberana bondade, o meigo Nazareno caminhou para ele, qual visão concretizada de um dos deuses de suas antigas crenças, e, pousando carinhosamente a destra em sua fronte, exclamou em linguagem encantadora, que Públio entendeu perfeitamente, como se ouvisse o idioma patrício, dando-lhe a inesquecível impressão de que a palavra era de espírito para espírito, de coração para coração:

- Senador, por que me procuras? - e, espraiando o olhar profundo na paisagem, como se desejasse que a sua voz fosse ouvida por todos os homens do planeta, rematou com serena nobreza: - Fora melhor que me procurasses publicamente e na hora mais clara do dia, para que pudesses adquirir, de uma só vez e para toda a vida, a lição sublime da fé e da humildade...

Mas, eu não vim ao mundo para derrogar as leis supremas da Natureza e venho ao encontro do teu coração desfalecido!...

Públio Lentulus nada pôde exprimir, além das suas lágrimas copiosas, pensando amargamente na filhinha; mas o profeta, como se prescindisse das suas palavras articuladas, continuou:

- Sim... Não venho buscar o homem de Estado, superficial e orgulhoso, que só os séculos de sofrimento podem encaminhar ao regaço de meu Pai; venho atender às súplicas de um coração desditoso e oprimido e, ainda assim, meu amigo, não é o teu sentimento que salva a filhinha leprosa e desvalida pela ciência do mundo, porque tens ainda a razão egoística e humana; é, sim, a fé e o amor de tua mulher, porque a fé é divina... Basta um raio só de suas energias poderosas para que se pulverizem todos os monumentos das vaidades da Terra...

Comovido e magnetizado, o senador considerou, intimamente, que seu espírito pairava numa atmosfera de sonho, tais as comoções desconhecidas e imprevistas que se lhe represavam no coração, querendo crer que os seus sentidos reais se achavam travados num jogo incompreensível de completa ilusão.

- Não, meu amigo, não estás sonhando... - exclamou meigo e enérgico o Mestre, adivinhando-lhe os pensamentos. - Depois de longos anos de desvio do bom caminho, pelo sendal dos erros clamorosos, encontras, hoje, um ponto de referência para a regeneração de toda a tua vida.

Está, porém, no teu querer o aproveitá-lo agora, ou daqui a alguns milênios... Se o desdobramento da vida humana está subordinado às circunstâncias, és obrigado a considerar que elas existem de toda a natureza, cumprindo às criaturas a obrigação de exercitar o poder da vontade e do sentimento, buscando aproximar seus destinos das correntes do bem e do amor aos semelhantes.

Soa para teu espírito, neste momento, um minuto glorioso, se conseguires utilizar tua liberdade para que seja ele, em teu coração, doravante, um cântico de amor, de humildade e de fé, na hora indeterminável da redenção, dentro da eternidade...

Mas, ninguém poderá agir contra a tua própria consciência, se quiseres desprezar indefinidamente este minuto ditoso!

Pastor das almas humanas, desde a formação deste planeta, há muitos milênios venho procurando reunir as ovelhas tresmalhadas, tentando trazer-lhes ao coração as alegrias eternas do reinado de Deus e de sua justiça!

Públio fitou aquele homem extraordinário, cujo desassombro provocava admiração e espanto.

Humildade? Que credenciais lhe apresentava o profeta para lhe falar assim, a ele senador do Império, revestido de todos os poderes diante de um vassalo?

Num minuto, lembrou a cidade dos césares, coberta de triunfos e glórias, cujos monumentos e poderes acreditava, naquele momento, fossem imortais.

- Todos os poderes do teu império são bem fracos e todas as suas riquezas bem miseráveis.

As magnificências dos césares são ilusões efêmeras de um dia, porque todos os sábios, como todos os guerreiros, são chamados no momento oportuno aos tribunais da justiça de meu Pai que está no Céu.

Um dia, deixarão de existir as suas águias poderosas, sob um punhado de cinzas misérrimas. Suas ciências se transformarão ao sopro dos esforços de outros trabalhadores mais dignos do progresso, suas leis iníquas serão tragadas no abismo tenebroso destes séculos de impiedade, porque só uma lei existe e sobreviverá aos escombros da inquietação do homem – a lei do amor, instituída por meu Pai, desde o princípio da criação...

Agora, volta ao lar, consciente das responsabilidades do teu destino...

Se a fé instituiu na tua casa o que consideras a alegria com o restabelecimento de tua filha, não te esqueças de que isso representa um agravo de deveres para o teu coração, diante de nosso Pai, Todo-Poderoso!...

O senador quis falar, mas a voz tornara-se-lhe embargada de comoção e de profundos sentimentos.

Desejou retirar-se, porém, nesse momento, notou que o profeta de Nazaré se transfigurava de olhos fitos no céu...

Aquele sítio deveria ser um santuário de suas meditações e de suas preces, no coração perfumado da Natureza, porque Públio adivinhou que ele orava intensamente, observando que lágrimas copiosas lhe lavavam o rosto, banhado então por uma claridade branda, evidenciando a sua beleza serena e indefinível melancolia..

Nesse instante, contudo, suave torpor paralisou as faculdades de observação do patrício, que se aquietou estarrecido.

Deviam ser vinte e uma horas, quando o senador sentiu que despertava.

Leve aragem acariciava-lhe os cabelos e a Lua entornava seus raios argênteos no espelho carinhoso e imenso das águas.

Guardando na memória os mínimos pormenores daquele minuto inesquecível, Públio sentiu-se humilhado e diminuído, em face da fraqueza de que dera testemunho diante daquele homem extraordinário.

Uma torrente de ideias antagônicas represava-se-lhe no cérebro, acerca de suas admoestações e daquelas palavras agora arquivadas para sempre no âmago da sua consciência.

Também Roma não possuía os seus feiticeiros? Buscou rememorar todos os dramas misteriosos da cidade distante, com as suas figuras impressionantes e incompreensíveis.

Não seria aquele homem uma cópia fiel dos magos e adivinhos que preocupavam igualmente a sociedade romana?

Deveria ele, então, abandonar as suas mais caras tradições de pátria e família para tornar-se um homem humilde e irmão de todas as criaturas?

Sorria consigo mesmo, na sua presumida superioridade, examinando a inanidade daquelas exortações que considerava desprezíveis. Entretanto, subiam-lhe do coração ao cérebro outros apelos comovedores. Não falara o profeta da oportunidade única e maravilhosa? Não prometera, com firmeza, a cura da filhinha à conta da fé ardente de Lívia?

Mergulhado nessas cogitações íntimas, abriu cautelosamente a porta da residência, encaminhando-se ansioso ao quarto da enferma e, oh! Suave milagre! A filhinha repousava nos braços de Lívia, com absoluta serenidade.

Sobre-humana e desconhecida força mitigara-lhe os padecimentos atrozes, porque seus olhos deixavam entrever uma doce satisfação infantil, iluminando-lhe o semblante risonho. Lívia contou-lhe, então, cheia de júbilo maternal, que, em dado momento, a pequenina dissera experimentar na fronte o contato de mãos carinhosas, sentando-se em seguida no leito, como se uma energia misteriosa lhe vitalizasse o organismo de maneira imprevista. Alimentara-se, a febre desaparecera contra todas as expectativas; ela já revelava atitudes de convalescente palestrando com a mãezinha, com a graça espontânea da sua meninice.

 

Introdução do livro: O LIVRE ARBÍTRIO E O MÉRITO DE A GRANDE SINTESE DE JESUS