Sentimento é gerador de muitos males.
A sempre fecunda e abundante fonte de pesquisa que se constitui a Revista Espírita, lançada por Allan Kardec em 1858, apresenta preciosidades para o estudo e entendimento das lições de Jesus e da Doutrina Espírita.
Estando sempre envolvido com suas páginas para matérias desta seção da RIE, vamos descobrindo tesouros esquecidos que merecem divulgação para ampliar o universo das reflexões.
Pois bem, na edição de setembro de 1865, Kardec publicou uma matéria intitulada Um Egoísta, apresentando um estudo espírita moral, como ele mesmo qualificou. Trata-se de um relato apresentado por um de seus correspondentes que comenta sobre a existência de um moço que morava com sua velha tia, que muito o amava.
Ocorre, porém, que o comportamento do moço, em relação à tia, era de completa indiferença quanto a poupar-lhe esforços e sacrifícios, pois que “Ele não arredava um móvel em casa, como se tivesse criados às suas ordens; até se previsse algum penoso serviço excepcional, arranjava um pretexto para se abster, temeroso que lhe pedissem uma ajuda, que não poderia recusar. (…) era insensível (…)”, como consta do texto original da Revue.
Apesar do comportamento, “Era espírita e, sob o domínio dessa crença se melhorou, posto não a tivesse aproveitado tanto quanto poderia tê-lo feito, devido à sua inteligência (…)”. Devido, porém, aos esforços contínuos e sacrificiais, a velha tia adoeceu, desenvolvendo uma hérnia muito grave, que aumentou seu sofrimento. Após relativo tempo, porém, o moço sofreu um acidente e desencarnou.Kardec, após tomar conhecimento do fato pelo relato recebido pelo correspondente, resolveu evocar o moço e não conseguiu, devido às precárias condições do espírito, mas recebeu valiosa orientação assinada por Vosso Guia Espiritual, que está na íntegra publicada na edição referida. O texto é de uma clareza meridiana. Transcrevemos trechos parciais:
1) “(…) Neste momento está muito perturbado pelos pensamentos que o agitam. Vê sua tia e a doença que ela contraiu devida às fadigas corporais e da qual morrerá. Eis o que o atormenta, pois se considera o seu matador. Como efeito o é, pois podia poupar-lhe o trabalho que será a causa de sua morte. É para ele um remorso pungente que o perseguirá por muito tempo, até que tenha reparado a sua falta.(…)”.
2) “(…) Para seu castigo, deve vê-la morrer em conseqüência de sua indiferença egoísta, porque sua conduta é uma variedade de egoísmo (…)”.
O Espírito sugere e mesmo solicita que o grupo ore pelo espírito, para ajudá-lo a superar o desespero em que se encontrava, mas Kardec pondera se será levado em conta a correção de outros defeitos, que o moço conseguiu por força do conhecimento espírita, e se isto não abrandaria sua situação.
Eis trechos parciais da resposta:
1) “Sem nenhuma dúvida, essa melhora lhe é levada em conta, pois nada escapa ao olhar perscrutador da divina providência. Mas eis de que maneira cada boa ação ou má ação tem suas conseqüências naturais, inevitáveis, conforme a palavra do Cristo: ‘A cada um segundo as suas obras’, ou seja, o que se corrigiu de algumas falhas se poupa da punição que as mesmas teriam acarretado e recebe, ao contrário, o prêmio das qualidades que as substituíram; mas não pode escapar às conseqüências dos defeitos que persistem. (…)”.
2) “(…) Meus amigos, o egoísmo é o que melhor se vê nos outros, porque a gente sente o seu contragolpe e porque o egoísta nos fere; mas o egoísta encontra em si mesmo sua satisfação, razão por que dele não se apercebe. O egoísmo é sempre uma prova de secura do coração; estiola a sensibilidade para os sofrimentos alheios. (…)”.
3) “(…) do egoísta não espereis senão a ingratidão (…) Só age por outro quando forçado; nunca espontaneamente (…)”.
4) “(…) o egoísmo é o verme roedor da sociedade (…)”.
Lição viva para pensar! E nos motivar inclusive para um estudo complementar em O Céu e o Inferno, exatamente no capítulo VII em que Kardec publicou o magistral Código Penal da Vida Futura, um resumo da lei quanto à posição dos espíritos após a desencarnação ou no que respeita ao futuro da alma, fruto da observação de depoimentos trazidos pelos próprios espíritos.
É notório considerar como de grandes prejuízos para a alma humana e para a sociedade em geral, os efeitos do egoísmo. Conforme os próprios espíritos declararam, o egoísmo é o vício que se pode considerar como o mais radical (questão 913 de O Livro dos Espíritos). E vão além, declarando que “Daí deriva todo mal. Estudai todos os vícios e vereis que no fundo de todos há egoísmo (…)” (transcrição parcial da resposta à questão citada neste parágrafo).
O exemplo trazido por Kardec em sua Revue é localizado, envolveu duas pessoas. A velha tia era obrigada a cortar lenha para sobreviver e tudo mediante a indiferença do sobrinho. Embora seja um exemplo do passado (hoje dificilmente é preciso cortar lenha), ele pode ser trazido para os dias atuais e servir como parâmetro para uma automedição de como estamos agindo no relacionamento. Até como forma de avaliarmos os progressos neste campo, para não carregarmos conosco o arrependimento doloroso de um comportamento egoísta e indiferente.
Desafio para todos nós, espíritos em aprendizado.
Matéria publicada originariamente na Revista Internacional de Espiritismo, edição de junho de 2004.
Fonte: Grupo Espírita Renascer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário