domingo, 1 de maio de 2011

O LUGAR SECRETO

Nos Salmos do Antigo Testamento e nos Evangelhos há referências expressas ao “lugar secreto”, sede de nossa consciência, o nosso ser íntimo.
Nele originam-se os pensamentos, as resoluções interiores, mesmo quando derivadas de sugestões de outros seres. O Espírito nele reina soberano, no exercício de seu livre-arbítrio.
“A consciência é um pensamento íntimo, que pertence ao homem, como todos os outros pensamentos.”
“Pois que tem a liberdade de pensar, tem igualmente a de obrar. Sem o livre-arbítrio, o homem seria máquina.” (“O Livro dos Espíritos”, Questões 835 e 843.)
Nenhuma causa assenta-se de fora para dentro. O interior é que produz o exterior.
Acontece freqüentemente, no curso da vida, a sujeição de nossos pensamentos a hábitos adquiridos, estereotipando idéias que se tornam fixas, invariáveis, mas sempre com nossa concordância. Se os hábitos-pensamentos ajustam-se à Lei Divina, tanto melhor para o ser. Mas se violam a Lei, responderemos pelas conseqüências.
Isto justifica a necessidade de vigilância permanente, de esclarecimento constante do Espírito, para que a prática da vida, desdobrando-se nas ações mais variadas, resulte de pensamentos retos.
Se bem atentarmos nos ensinamentos de Jesus, que para muitos parecem extremamente complexos e fora da realidade da vida, se nos aplicarmos às verdades trazidas pelo Consolador aos tempos modernos, rememorando aqueles ensinos, depararemos com uma certeza muito clara e evidente: a mensagem do Cristo, revivida na Doutrina dos Espíritos, é de natureza transcendente, porque provém do Alto, mas é de índole prática por excelência, porque indica a cada indivíduo o “caminho e a verdade” para que seu procedimento o conduza à própria felicidade, à “salvação”, ao progresso contínuo, tal o seu destino.
Ë óbvio reconhecer, pois, a extrema importância da orientação que dada um imprime ao seu íntimo. Pensar retamente, de conformidade com a Lei, resultará em que, agora ou depois, tudo estará bem no mundo exterior.
O papel das religiões e filosofias pode ser resumido, em todos os tempos, em ajudar e esclarecer o homem, para que pense corretamente, aproximando-o das realidades e da verdade. Não sendo elas detentoras da verdade absoluta, representam parcelas de conhecimento que estão em consonância com o patamar evolutivo das raças e povos.
A vinda do Cristo, o Guia e Governador espiritual do nosso mundo, complementa e retifica as religiões e filosofias, suprindo suas carências e desvios, como torna patente a Terceira Revelação.
Entretanto, podemos observar que a Humanidade, na sua maior parcela, tem invertido os termos da realidade. Desde os tempos primitivos da vida do homem neste Planeta, prevalece a ilusão de que os atos exteriores, de fácil observação pelo fascínio que exercem sobre os sentidos físicos, podem ocupar o lugar do pensamento e do sentimento.
Por isso, na política e nas regras das sociedades humanas tem prevalecido a idéia de que as leis e instituições da Terra resolvem todos os problemas do homem, mesmo que permaneça ele mau, ignorante e despreparado.
Sucedem-se então as tentativas de criarem-se instituições perfeitas e leis justas para atenderem às mais diferentes necessidades humanas. Acontece que as desilusões também se sucedem, eis que não podem surgir instituições e leis justas e perfeitas criadas e sustentadas por mentes desajustadas da Lei maior, nem cumpridas boas normas por indivíduos despreparados.
Toda a gama de regimes políticos e sistemas sociais, desde os reinados e principados absolutos até os sistemas atuais de democracias representativas e socialistas, passando por todas as experiências escravocratas, feudais, ditatoriais e quantas que se conhecem, incidem no mesmo erro, o da ilusão de que as ações exteriores podem substituir o pensamento correto. Entretanto, o pensamento reto só pode ser gerado pelas mentes reeducadas no bem.
No domínio das religiões ocorre fato semelhante, com o predomínio do culto exterior nas massas dos seguidores, com prejuízo do culto interior, além dos desvios de princípios essenciais, pelas falsas interpretações e pela imposição de dogmas impróprios. É o que se observa nas grandes religiões tradicionais e nas seitas atuais que proliferam por toda parte.
As instituições humanas só se aproximarão da perfeição quando resultarem, na sua criação e no seu funcionamento, de consciências retas e de sentimentos puros. Por isso será necessário, antes, forjarem-se os caracteres morais. Todo um programa de reeducação integral está à espera do interesse dos homens.
Enquanto predominar nas massas o egoísmo coletivo, como somatório do egoísmo individual, enquanto for lugar comum a inveja, a ganância e a corrupção em detrimento do amor e da justiça concebidos interiormente, para que se manifestem na compreensão exterior, enquanto prevalecer a indiferença entre os indivíduos, sufocando a solidariedade, estaremos diante de sinais inequívocos de que os homens continuam iludidos pelas exterioridades, sem atentarem para a necessidade de estancar em seu nascedouro, no íntimo dos seres, as causas dos males evidentes.
Todas as mazelas humanas que se manifestam sob as múltiplas formas do egoísmo e do orgulho só serão detidas quando substituídos esses sentimentos negativos pelas formas positivas do amor e da justiça interiores. E uma questão de educação do Espírito para que atente no seu próprio destino: o progresso intelectual e moral.
No campo social, a felicidade coletiva é a soma do esforço individual no bem. O melhor para todos depende da reeducação dos pensamentos e dos sentimentos de cada um.
Nossa função não é a de criar o bem, já que ele existe de toda a eternidade. Nosso papel é o de aceitá-lo interiormente e de exercitá-lo em pensamentos e ações. A mensagem do Cristo e o ensino dos Espíritos Superiores preconizam exatamente nossa harmonização com o determinismo do bem.
Felizes os que aprendem as retas veredas da alma, assenhoreiam-se de seus pensamentos e os ajustam aos ensinamentos do Mestre Divino, no seu sentido espiritual transcendente.
A busca do bem e da verdade assemelha-se ao trabalho de garimpagem. Para encontrá-los em meio à ganga torna-se imprescindível não só o esforço inteligente, mas também a simplicidade de coração, para só assimilar o correto e o justo perante a Lei Divina.
A paz interior baseia-se na estabilidade do coração, quando há firmeza na busca do bem.
Ouvimos muitas vezes de companheiros espíritas que o conhecimento da Doutrina e o esforço na prática de seus princípios morais foi fator decisivo na modificação de suas vidas. Nada mais lógico e natural.
Quando conhecemos a verdade e aceitamos determinados princípios que conduzem à realidade de nosso ser, a experiência acrescida nos leva à criação de novas condições interiores, com reflexos em todo o ambiente que nos é próprio.
Pensamentos retos produzem modificações na maneira incorreta de agir. Se passamos a preocupar-nos com os postulados da consoladora Doutrina Espírita, esforçando-nos em ceder algo em favor dos outros, somos despertados pelo amor fraterno, sentindo a necessidade do próximo, a angústia do vizinho, o sofrimento das pessoas. Atraímos condições especiais em nosso meio, adotamos nova tábua de valores, entre os quais os bens materiais já não ocupam os primeiros lugares.
Esforçamo-nos, enfim, pelo nascimento interior de um reino que nos pertence e que podemos governar com a consciência permanentemente em busca da paz.
É natural que não somente nós percebamos as transformações íntimas, mas também os que nos rodeiam. Os familiares e amigos, parentes e companheiros de jornada percebem a mudança, embora quase sempre atribuindo-a às circunstâncias externas.
O homem permanecerá escravo do erro e da ignorância, sofrendo-lhes as conseqüências enquanto não se libertar pelo conhecimento de si mesmo e das leis da vida.
Para a libertação da Humanidade, Jesus, seu Guia e Salvador, afirmou:  “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.”
Sua pregação revelou grande parte da Verdade, mostrando-nos Deus na figura de Pai e Criador e ensinando aos homens como viver e como morrer. Em nova etapa do conhecimento da Verdade, os Espíritos do Senhor desvendaram os segredos da morte, na vida que se desdobra infindável, sob outras formas e dimensões.
O “lugar secreto” é o reino interno da nossa mentalidade. Todos os nossos pensamentos são aí criados. Os pensamentos induzidos por outrem são perfilhados ou rejeitados. Somente o próprio Espírito tem o domínio de sua consciência. O livre-arbítrio é um dos dons com que o Criador dotou o Espírito imortal.
Criado ou adotado certo pensamento, produz ele conseqüências inevitáveis. Assim, se não desejamos determinados efeitos, o meio normal de evitá-los é abstermo-nos da geratriz, que se encontra dentro de nós.
Por aí podemos perceber a extensão e a importância da vigilância interior, coadjuvada pela oração, a forma de evitar e repelir os pensamentos indesejáveis.
Igualmente podemos entender melhor o sentido do pecado por pensamentos que muitos rejeitam por entenderem que não tem existência real. O erro está em considerar irreal o que é imaterial.
Não se podem separar emoções e sentimentos dos pensamentos correspondentes.
O amor, a bondade, a alegria sã, a doçura, a piedade e todos os sentimentos elevados induzem pensamentos positivos que com eles se confundem. Produzem o otimismo, a confiança, a certeza, a fé. Já quando alimentamos sentimentos de ódio, raiva, rancor, inveja, despeito, nossos pensamentos geram mal-estar em nós e nos outros, produzindo danos à saúde do corpo e do Espírito.
A força do pensamento, bem dirigida, permite ao Espírito a aproximação com o Criador.
É lei da vida que, pela forma como pensamos, falamos, agimos e escolhemos nossas companhias espirituais.
Qualquer que seja a conduta adotada, invariavelmente ela voltará para nós, cedo ou tarde.
O bem ou o mal que desejamos e que dedicamos aos outros, recebê-los-emos de volta, aqui ou alhures.
Fonte: Reformador – junho, 1989.

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