Os dias que longe vão levam-me à triste
lembrança de meu afastamento obrigatório, através do aborto.
Ainda me recordo daquela noite, em que às
pressas fui convocado para reencarnar, porque uma inexperiente jovem acabara de
se entregar aos braços de um rapaz que tanto amava.
O amor se realizara fecundo fora o óvulo na
presença da vida, e a concepção se faziam e eu, de uma forma repentina, me via
ligado àquela criatura que me receberia em seus braços, como filho querido.
Dias, semanas e meses se passaram. Agora,
nada mais dava para esconder. A notícia chegara ao conhecimento dos familiares
que seriam meus avós maternos, e, por não quererem ver a família passar diante
da sociedade por esse ato vergonhoso, obrigaram aquela jovem futura mãezinha abortar-me.
Duas escolhas lhe propuseram: o aborto ou
rua!
A inexperiente jovem, sem saber o que fazer,
sozinha, diante de tão triste situação, porque já amava o pequenino feto que se
desenvolvia dentro de suas entranhas, derramava lágrimas copiosas.
Não faltou, porém, quem não a aconselhasse:
quase todos tinham a mesma opinião, parentes, vizinhos e amigos.
“Vamos, menina, o que você está esperando? Vá
logo abortar essa criança, para que a mesma não venha ser a vergonha de sua tão
honrada família”.
E, assim, na calada noite, senti frios aços
vindo de encontro a mim, impulsionados pelas mãos de uma parteira curiosa,
expulsando-me sem piedade.
E aqui termino mais um triste episódio da
curta vida de um feto que foi denominado,
“A Vergonha”
Livro: Os abortados
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