quinta-feira, 26 de março de 2009

O ESPIRITISMO CRISTÃO NA OBRA DA CONFRATERNIZAÇÃO


Queridos Irmãos: nós vos saudamos gostosamente, por esta oportunidade de estreitar mais intimamente os nossos laços afetivos...
E isto devemos a este Congresso.
Plagiando um poeta, nós diríamos:
— Quanto de amor este Congresso encerra?
— Não sei, mas digo o mesmo que outra voz... é um pouquinho do céu por sobre a terra.
E’ um pouquinho de luz por sobre nós.
Bem. Não vamos chorar por isso e pela música dos versos.
Este Congresso nós classificamos profanamente, como o congresso do “bota fogo” do entusiasmo nos “cantos” do Estado “do Rio” de Janeiro!
Sei que o Leopoldo, grande amigo do futebol, discorda e diz conselheiral:
— Congresso do “bota fogo” não, congresso de “fluminenses”... Vá lá que seja... Eu porém não sou daqui, nem de Niterói!
I - Definições fundamentais
Antes do mais, daremos aos termos da tese que nos foi distribuída, uma interpretação básica.
A — Que é espiritismo?
Não cabe aqui provar que o Espiritismo é uma religião — ou a religião, no seu íntegro significado, etimológico ou teologal, cúpula das filosofias, como estas são a cúpula das ciências menores.
Como resultado de nossos estudos sobre ele, chegamos a esta conclusão: o Espiritismo é a religião monoteísta baseada no espírito dos Evangelhos de Jesus Cristo.
Sendo uma religião, monoteísta, o Espiritismo admite um criador do Universo, —inteligência suprema que governa os destinos de sua criação com sabedoria, bondade, justiça e arte.
E por ser religião orientada por uma inteligência criadora de todas as coisas ele não pode apartar-se da filosofia e das ciências por ela supervisionadas.
O espiritismo procura conhecer a criação divina quando a estudo objetivamente pelas ciências; explica o porque da criação quando a interpreta “per altíssimas causas” com a filosofia; sublima a criação quando prega a prática das leis morais que conduzem o homem para a harmonia universal.
B — Que é o espiritismo cristão?
Essa expressão é quase pleonástica. Não entendemos espiritismo que não seja cristão.
Se quisermos porém dar a essa expressão o sentido religioso do espiritismo, achamos que vale como convenção. E sentimos que foi esse o significado atribuído pelo distribuidor das teses.
Sabem os espíritas que por esse sectarismo próprio do homem, há Centros, há Federações e há Pátrias, que secionam um galho da religião e o plantam; e o alimentam, e aguardam que ele cresça como o tronco. Acontece, então, por analogia com a botânica, esse fenômeno: ou o terreno é bom e o galho produzirá os frutos da árvore original; ou o terreno é árido e ele definha e morre.
Daí o dizermos: a França plantou o ramo da Filosofia espírita, a Inglaterra plantou o ramo da Ciência espírita e o Brasil o da Religião espírita.
O tronco original porém é indivisível — é o Espiritismo. Seus frutos deverão ter sempre o mesmo sabor: quando alimentam a ciência, quando impulsionam a filosofia, quando acalentam a religião.
C — Que é confraternização?
Confraternizar quer dizer para nós, aproximar irmãos.
— Que é irmão e quais são os nossos irmãos?
Irmão é o que está ligado a nós como filhos do mesmo Pai. E assim sendo deve compartilhar das nossas alegrias. Deve dividir conosco o seu pão material e espiritual. Deve procurar diminuir as nossas mágoas e as nossas dores. Deve amparar-nos nos nossos erros e reeducar-nos para o bem.
Confraternizar é, pois, sentir que somos todos irmãos; é agir no sentido de tornar a fraternidade universal!
II — O Espiritismo pode fazer a confraternização?
Sentimos que só uma religião que não interpuser barreiras entre as criaturas humanas, poderá tornar real a confraternização. Sejam essas barreiras sociais ou culturais; geográficas ou históricas; econômicas ou espirituais; concretas ou convencionais. E afirmamos:
—O Espiritismo, pode fazer a confraternização, porque:
Primeiro:
— O espiritismo uniu a fé à razão.
As religiões todas do passado e as do presente, viveram agarradas ao princípio de que a fé não pode enfrentar a razão face a face. A fé raciocinada deixaria de ser fé.
Esse principio é, ainda nos tempos atuais, uma das causas maiores do afastamento do homem do seio da religião.
E os que permanecem dentro das religiões evitando que sua fé seja iluminada pela razão, quase sempre o fazem: por temor de um Deus implacável — e é o primitivismo; por ignorância consciente — e é a indolência mental, por displicência — e é uma forma de materialismo; por respeito ao mundo, e é a hipocrisia.
Daí a onda justa dos que vêm na religião o ópio do povo. Daí a maré montante da revolta contra um Criador que cria castas e privilégios. Daí o desprezo pela religião que separa cada vez mais os homens.
Jesus Cristo explicou: Deus falou de sua existência, justiça, bondade, verdade e arte. Ele mesmo se fez a escada para que os homens pudessem ir por ele até o Pai, adquirindo os conhecimentos indispensáveis. Esse Criador nos deu a razão para que a exercitássemos no seu conhecimento. E nenhum caminho mais certo para conhecer um Criador do que conhecendo os frutos de sua criação.
Esse Criador, longe de ser o ditador que usa e abusa de seu poder, manda-nos falar que chegaremos até ele porque somos deuses também.
Dá-nos a liberdade sem peias e convenções, mas a liberdade no seu significado verdadeiro. Liberdade de escolhermos a nossa profissão; a nossa esposa; a atividade material ou espiritual; a pátria; o bem ou o mal.
Sua constituição é eterna sem a mutabilidade convencional dos homens. E’ um código perfeito de leis físicas e leis morais.
As leis físicas são tão perfeitas que Isaac Newton e outros gênios calcularam sobre elas, prevendo fenômenos astronômicos para daqui a milênios, na confiança de sua imutabilidade. Tão perfeitas que o conhecimento parcial do seu minúsculo átomo faz tremer gênios e nações.
As leis morais conduzem os próprios ateístas, que se fazem cobaias da ciência pelo gozo íntimo dessas leis universais do amor. Negam a existência do Criador, mas ambicionam o gozo paradisíaco que as leis morais lhes concedem.
E é assim raciocinando que o Espiritismo aproxima a fé da razão. Ilumina-a com as luzes da razão.
E aproximando e interdependendo Religião e Ciência, ele faz a soldagem dos elos que foram rompidos há milênios, pelos que não puderam ou não quiseram chegar a DEUS através da razão.
Segundo:
—O Espiritismo aproxima todas as religiões.
Por haver decepado um ramo da religião, a humanidade tem vivido a atirá-lo contra os outros ramos. Usou-o sempre como arma branca de destruição e não como origem da árvore do caminho que dá frutos a quem queira colhê-los.
Daí o desvirtuamento do verdadeiro significado da religião.
E elas tem sido a causa maior das lutas e das separações
Para a religião A os que estão fora dela são condenados; para B são bárbaros; para C são demônios... E todos os meios tem sido para saciar a sede de luta, de egoísmo, de interesses do homem, acobertado pela capa do serviço divino.
O Espiritismo vem reformar essa concepção, revivendo claras e luminosas as próprias palavras de Jesus.
Mas se não é dado ao verdadeiro religioso, combater pela violência os que não pensam como ele, não é isto conselho para a inércia ou para a temeridade que leva ao holocausto místico.
Há urna atividade aparentemente defensiva contra a qual esboroam-se todos os ataques.
E’ o “Fora da caridade não há salvação”.
O Espiritismo não é a religião dos que se dizem espíritas, mas sim dos que fazem a caridade, quer com o seu rótulo próprio, quer sob o dístico de justiça social.
Repartir as nossas posses materiais e espirituais com os que tem menos é o lema do Espiritismo, para compensar os erros da humanidade.
E afirma que não cabe a salvação aos seus adeptos, mas àqueles que já sentem no coração o amor fraternal.
O Espiritismo não poderá repetir os crimes do passado, porque vê em todas as criaturas o mesmo irmão cuja religiosidade ou irreligiosidade, nada diz do seu valor moral. E afirma: o homem vale pela pureza de seus atos de amor.
Terceiro:
—O Espiritismo prepara a união do poder temporal ao espiritual.
Outro grave erro de todas as religiões foi o querer impor a idéia de Deus assenhoreando-se do poder temporal.
O espiritismo vê o erro político mas não o estimula nem lança os mais errados contra os menos errados . Mostra com a ação, como se pode dar todo bem estar verdadeiro ao povo.
A felicidade foi sempre o sonho de todos os homens. Mas a felicidade conquistada sob o aspecto sectarista levou o homem à pior das infelicidades que é o enfado da posse de uma falsa felicidade.
Para o sensual a felicidade e a conquista da carne; para o glutão é a mesa farta: para o artista é o êxtase do belo.
A humanidade não quis compreender ainda, que há dois planos distintos que se completam e se subordinam: o material e o espiritual. E para melhor satisfação de apetites viciosos os tem separado de tal modo que um permanece “alto de mais em cima”, e o outro, “baixo de mais em baixo”.
Se há dois campos de atividades para o composto humano — alma e corpo — cumpre compreender seus misteres.
Cabe à política o dever de bem governar os interesses materiais dos vivos e estimular as suas tendências artísticas e intelectuais.
Cabe à religião apoiar as medidas acertadas dos políticos e compensar de todos os modos os seus erros.
O Espiritismo, sabendo que o poder temporal confundir-se-á com o espiritual um dia —pois seremos um só rebanho com um só pastor — completa a tarefa da política: educa os homens para as conquistas espirituais; cuida da matéria amparando com suas obras sociais aqueles que são os esquecidos do poder temporal.
—E porque o Espiritismo não precipita essa união dos poderes temporal e espiritual?
—Porquê sabe que não se constroem patrias felizes com povos maus e incultos. Não há um órgão perfeito quando suas células são doentias — é o chavão clássico
Que os políticos lutem pelo poder temporal. Encontrarão sempre no Espiritismo um complemento de seu trabalho.
O Espiritismo continuará sempre a amparar os velhos; a dar morada às viúvas; a alimentar as crianças; a curar os enfermos.
Continuará sempre a educar os criminosos; a iluminar os jovens; a alfabetizar as crianças e também a pedir bênçãos e forças morais para os governantes.
A política pois, quando arte ou ciência de bem governar os povos, ou não, terá no Espiritismo um complemento amigo e fraterno para suas atividades.
Quarto:
— O Espiritismo envolve no mesmo amplexo todas as raças, povos, culturas, sexos e idades.
Seria alongar com argumentos uma premissa desta tese cujos fatos confirmam com mais força.
A humanidade periodicamente, luta por ideais que pairam acima das inteligências e corações, como um velocino de ouro.
Foi na revolução francesa o lema — igualdade, liberdade e fraternidade.
Foi na guerra última o sonho das quatro liberdades.
Não entraremos em análises das cinzas desses ideais. Relembraremos frases sínteses como esta: “Liberdade, liberdade, quantos crimes se cometem à sombra do teu nome”.
Morreu Roosevelt e com ele a força moral das quatro liberdades.
Entretanto, sem grandes revoluções e sem grandes guerras, mas em pequenos Centros e em pequenas e humildes criaturas, o Espiritismo vai executando os programas símbolos que outros furtam parcialmente aos Evangelhos de Jesus Cristo.
O Espiritismo não tem orientação internacional, nem municipal. . . Os Centros vivem no gozo de absoluta liberdade. E não é só: os seus adeptos interpretam os Evangelhos de Jesus do seu modo, à sua maneira: quando sinceros recebem iluminação; quando hipócritas, passam como o fogo fátuo. E no gozo de tanta liberdade, a ponto de lutarem em campo limpo federações contra ligas, semanas espíritas contra congressos espíritas; Centros contra tendas, adeptos contra adeptos, eles, no fundo, sentem de comum, as bases fundamentais dos Evangelhos de Jesus.
Mas se a liberdade nossa é já uma conquista que em outra qualquer organização seria o escândalo e a guerra até, a igualdade é ação contínua entre nós.
Nas nossas noites de estudo lá estão em cadeiras estofadas ou em bancos rústicos, letrados e analfabetos, pretos e brancos, velhos e crianças, homens e mulheres, almas corruptas e almas ingênuas...
Para qualquer estranho, as nossas palavras seriam figuras de retórica. Que venham, vejam e acreditarão.
RESUMINDO:
O Espiritismo pode fazer a confraternização universal porque já uniu praticamente uma parcela da humanidade, como reuniu sob um mesmo símbolo todas as idéias e concepções, firmado nos evangelhos de Jesus.

III — SE O ESPIRITISMO E’ PORTANTO A DOUTRINA CAPAZ DE REALIZAR A CONFRATERNIZAÇÃO, QUAIS OS DEVERES DOS ESPÍRITAS?
O Espiritismo enlaçando a fé e a razão; unindo pela caridade, religiosos e irreligiosos; ligando pela finalidade social os poderes temporal e espiritual; reunindo como irmãos todos os seres divinos, ele é, no momento, o campo de atividade da confraternização verdadeira.
E o plano de ação que concluímos, está assim delineado:
1.0 — Abrir escolas nos Centros e fora deles, para, difundindo a instrução, permitir à criança o uso consciente das leis divinas e, difundindo as lições de moral, permitir à criança caminhar sabiamente para a verdadeira felicidade.
2.0 — Fundar Juventudes Espíritas para que o entusiasmo dos jovens, seja guiado no caminho útil do esforço em comum e as suas dúvidas sejam esclarecidas sem o sectarismo que apaixona e logo desilude.
3.0 — Fundar orfanatos — verdadeiros lares de Jesus — onde a criança sem apoio material e moral, receba pão para o corpo e para oespírito. E à luz do Espiritismo compreenda o porque da sua situação. Só assim eliminaremos, com a educação desde o berço, os viciados e revoltados das sociedades futuras.
4.0 - Pregar com mais intensidade e vigor — dos Centros aos cárceres — conduzindo no coração os Evangelhos de Jesus, ao lado, os livros de ciência, os raciocínios das filosofias e os atos das outras religiões, para poder tirar conclusões com segurança e poder penetrar nas almas pelo cérebro e pelo coração.
5.0 — Fortalecer os nossos lares, fazendo realmente deles um lar espírita. Serão assim a fonte de retaguarda das nossas energias físicas e morais. Pois é com as forças neles auridas que as nossas conquistas espirituais confirmar-se-ão.
6.0 — Evitar cristãmente que as nossas rivalidades personalistas atrasem o progresso da doutrina. O escândalo que sai de nossos lábios é que faz o grande mal. Que o silêncio seja o refúgio nosso, quando tivermos a paz de consciência ou quando formos moralmente covardes para solucionarmos nossas incompatibilidades pessoais, com a sinceridade fraterna pregada por Jesus.
Criticar sempre, mas a sós e construtivamente, como aconselha o Cristo.
7.0 — Zelar, segundo a segundo, pelos nossos pensamentos, palavras e atos em todos os ambientes, pois a pregação pelo exemplo é a única real e capaz de fazer conversões.
E para finalizar, queridíssimos irmãos, nós sintetizamos assim, a nossa colaboração:
A pregação pelo exemplo é a base primeira da obra de confraternização do Espiritismo de Jesus!
Nova Iguaçu, 4 de Agosto de 1946. - Prof. Newton Gonçalves de Barros.
Fonte: A Voz dos Espíritos – setembro e outubro, 1946

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