Mais uma vez, em mais um dezembro, proponho-me à disquisição da mais bela angulação da Marialogia: a maternidade virginal daquela que teve por missão receber Jesus nos braços. Tenho escrito já sobre o fenômeno da “pseudociésis” segundo o qual se processa, em determinadas mulheres, todo o ciclo da gestação, não obstante o útero se lhes conservar vazio. Tenho explicado que o fenômeno é de natureza psíquica, podendo ser provocado por auto sugestão consciente, por auto-sugestão inconsciente e, ainda, por sugestão dum agente exterior, como por exemplo um hipnotizador, um magnetizador ou um Espírito desencarnado. Tenho demonstrado, apoditicamente, que os casos de “pseudociésis” não são tão raros quanto se possa supor e que as clínicas ginecológicas os catalogam com muita frequência. Bevin e Klinger estudaram 444 casos em suas clínicas. Tenho lembrado que a Medicina oficial faz questão de ignorar a última causa por mim enunciada, isto é, a “pseudociésis” provocada por Espíritos desencarnados; mas vê com muita naturalidade as demais causas. Tenho registrado casos remotos e casos recentes, aqueles retirados da própria literatura clássica do Espiritismo Científico, como as pesquisas de Gustave Geley relatadas em “Les Vies Successives” (vide “Reformador” de dezembro de 1969, pág. 286), e estes, retirados de obras modernas, como o caso narrado em “Instruções Psicofônicas”, de Francisco Cândido Xavier (idem, ibidem). Tenho tentado explicar ao leitor intransigentemente contrário a Roustaing que Maria sofreu precisamente os efeitos dum completo processo de “pseudociésis”, não apenas por auto-sugestão (cientificada que fora por antecipação de que daria à luz um messias), mas também por sugestão e influenciação (e proteção) dos Espíritos Superiores que a assistiram e a envolveram magneticamente desde o primeiro momento em que se decidiu a contribuir na gloriosa missão do Cristianismo.
Agora, em mais este dezembro, retorno ao mote para ilustrá-lo com novos elementos de comprovação a tudo quanto tenho dito. É claro que, desconhecendo a gênese e a síndrome do fenômeno, as aparentes gestantes sempre fizeram dele motivo de multifárias interpretações. A ignorância cria lendas, fantasias, até pretensões desmedidas, com a suposição de se estar na iminência de gerar um outro Cristo, etc. (leia-se, a propósito, “Führer, Schwãrmer und Rebellen», de René Fulop Miller, 1891; em português: “Os Grandes Sonhos da Humanidade”, tradução dos Drs. René Ledoux e Mário Quintana). A mulher que ignora a existência da “pseudocíésis” não entende como possa estar grávida sem ter nada no útero. E quando se trata de mulher solteira, ainda paga o amargo risco de ser acusada de leviana e impudente. Por seu turno, a Medicina não quer saber da explicação espírita e leva tudo à conta de histeria, desdobrada em duas hipóteses: a “pseudociésis” propriamente e a “falsa timpanite histérica”. Na primeira hipótese temos o quadro duma gravidez típica, com toda a sua sintomatologia, apenas ausentes, de fato, a fecundação e o feto. Eis aqui, então, a “falsa gravidez”, a “gravidez fantasma”, “gravidez nervosa”, “gravidez aparente”, “gravidez espúria”, “gravidez histérica”, enfim, a “pseudociésis”. Todos esses nomes são sinônimos. Na segunda hipótese temos a simulação histérica do quadro da chamada gravidez atípica, quando a sintomatologia ultrapassa os nove meses, desaparece, reaparece, prolonga-se mais ou menos, tudo subordinado à auto sugestão da mulher.
Colocado o problema em termos de histeria é claro que para nós, espíritas, crentes ou não de Roustaing, ele não nos interessa nem nos aquenta, pois à mesma conta a Medicina coloca a mediunidade, a incorporação sonambúlica, o próprio Espiritismo. Aliás, a tese da histeria, além de infundada, está, inclusive, bastante superada para muitos dos próprios médicos. Afirmar, ainda hoje em dia, que um médium é histérico é o mesmo que nada afirmar, porque já ninguém empresta crédito a tamanha tolice. Por outro lado, é de se notar que mesmo os mestres da Medicina andaram sempre se desentendendo em torno dessa anomalia. Lasêgne e Joseph Grasset (“Maladies du Systême Nerveux”, 1879) diziam que “a definição de histeria nunca foi e nem será dada”, enquanto Paul Hartemberg (“Les Timides et Ia T'imidité”, Paris, 1901) via na histeria “uma das maiores ilusões da Medicina”.
Ignoremos, pois, essa causa (a histeria) e suas controvérsias médicas. Concedamos, como bastante, que o fenômeno existe, é real e registrado clinicamente, apresentando duas facetas: características próprias da “falsa gravidez” (“pseudociésis”) e características próprias da timpanite ou falsa timpanite. Se, como Discutem ainda alguns médicos, são de natureza histérica ou não, isso não nos importa, porque, conforme já disse, a histeria, na escola espírita, está mais do que desmoralizada.
Cabe apenas esclarecer aqui que timpanite é o simples estufamento do ventre, muito comum aliás em números circenses. Essa distensão pode ser, gasosa ou não, total ou parcial. E falsa ou pseudo timpanite histérica é aquela provocada por auto sugestão consciente ou inconsciente. Resumindo essa sutil diferença: a “pseudociésis” é uma falsa gravidez que segue o quadro normal de toda gravidez, exceto quanto à existência dum feto real no útero; a falsa timpanite é uma falsa gravidez que desobedece ao ciclo normal da gestação, podendo aparecer e desaparecer a qualquer tempo, desenvolver-se a menos ou a mais de 9 meses. A primeira é sempre inconsciente; a segunda pode ser consciente ou inconsciente. A primeira é típica da mulher que se engana; a segunda é geralmente típica da mulher que engana. Uma falsa timpanite pode acabar originando uma “pseudociésis”; mas isso é assunto mais complexo que não me parece oportuno ser tratado aqui. O que a mais ainda valeria assinalar é apenas que tanto num caso como noutro “extremamente difícil é o diagnóstico”, conforme afirma o Dr. Clóvis Correia da Costa, no seu livro “Lições de Clínica Obstétrica”, 5ª edição revista e aumentada, Rio, 1953. E, na opinião de Joseph Bolivar De Lee e Jacob Pearl Greenhill, o diagnóstico “engana a habilidade diagnóstica de hábeis cirurgiões e parteiros os mais competentes» (“Tratado de Obstetrícia”, tradução dos Drs. A. Vespasiano Ramos e Ivan Távora Gama, Rio, 1950).
Agora trago para o leitor alguns casos de “pseudociésia” muito famosos, que se acham reproduzidos em diversas obras especializadas, cada qual mais interessante que o outro. Um desses casos - absolutamente verídico e dos mais célebres - ensejou inclusive a produção de excelente filme, exibido há cerca de 5 anos nas telas nacionais e intitulado “Madre Maria dos Anjos”. É a história dramática da Irmã Santa Maria dos Anjos, superiora do Convento das Ursulinas, em Loudon (no Malaui). Tinha alucinações, profundas crises nervosas, alegando que se aproximava dela, nesses momentos, o demônio, sacudindo-a e levando-a a víolentíssimas convulsões. Astarot (o demônio) acabou induzindo-a a crer que estava grávida dele e de tal maneira exerceu influência nesse sentido sôbre a pobre mulher que ela entrou em processo sugestivo (ou magnético?) de falsa gravidez. Paul Louis Edouard Maurice Fleury, na sua “Introduction à Ia Médecine de l'Esprit”, pág. 935, conta que para cessar o escândalo foi necessária a intervenção de Laubardemont, que disse a Richelieu: “É coisa estranha que lhe apareçam sinais de gravidez nos vômitos contínuos, nas dores de estômago, nas serosidades esbranquiçadas que lhe saem do seio”. Como é sabido, Maria dos Anjos foi perseguida, injuriada, caluniada, até flagelada devido à sua situação.
Em seu “Manuel Complét de Médecine Légale” (“Résumé des Meilleurs Ouvrages Publiés”), Paris, 1846, os Drs. Joseph Briand e Ernest Chaudé narram 5 outros casos semelhantes. Num convento, perto de Toulouse, na França, três irmãs apresentaram sintomas de gravidez, permitindo isso que duvidassem da sua castidade. Um médico parteiro, chamado ao convento, diagnosticou a gestação. Elas foram expulsas e, decorridos 9 meses, as crianças não nasceram. Uma delas acabou morrendo. Abriram-lhe então o ventre e verificaram estar vazio. Em outra cidade, uma jovem já sentia até os movimentos do feto em seu útero. Os Drs. Boudeloque e Lorr foram chamados, tendo este último confirmado a gravidez. Mais tarde verificou-se ser uma simples ”pseudociésis”. Finalmente há, naquela obra, narrado o caso duma princesa alemã que, vendo os seios e o ventre crescerem, procurou um parteiro de renome. Este diagnosticou a gravidez, e a princesa preparou todo o enxoval do futuro bebê. No nono mês, um belo dia, saiu-lhe do útero grande porção de água. Era uma hidropsia uterina, com toda a sintomatologia da “pseudociésis”.
Carl Schroeder, por seu turno, expõe no “Manuel des Accouchements” (1875), três casos não menos interessantes. Num deles o parteiro já se havia decidido, ante a demora, a praticar a craniotomia (retirada da criança morta aos pedaços), ou a cesariana, se estivesse ainda viva. Mas nada foi preciso, porque acabou verificando que não havia criança nenhuma ...
Vejamos agora 2 exemplos catalogados pelo renomado Hippolyte Bernheim, ilustre professor da Faculdade de Medicina de Nancy, autor de respeitáveis obras sobre o assunto, dentre as quais: “Hypnotisme, Suggestion, Psychotherapie” (1891) e ”Hypnotisme & Suggestion” (1910).
M. B., de 26 anos, em 4 anos de casada nunca tivera filhos. Um dia cessou-lhe a menstruação, o ventre cresceu e ela ficou muito feliz com a confirmação da parteira: seria mãe. No nono mês, porém, a criança não nasceu. Nem no 10º. Nem no 11º. Chamaram Rivière, que não teve dúvidas em diagnosticar a “pseudociésis”, “provocada pelo desejo ardente de ter filhos”. Decepcionada, a «mãe» viu seu ventre abaixar quase que instantaneamente ...
Mme. de Ia P., com 42 anos, anotou em si todos os sinais característicos da gravidez. Ao término da gestação a parteira e o médico aguardaram o momento crítico. Não veio. Passaram-se 30 dias até que o mesmo Rivière foi chamado e diagnosticou novo caso de “pseudociésis”. O ventre da mulher baixou imediatamente.
Gustave Joseph Witkowski publicou em 1892 um livro intitulado “Anecdotes et Curiosités sur les Accouchements”. É dele o seguinte caso: “O Procurador de Paris, após receber inúmeras cartas anônimas contra Celina B., fez instaurar inquérito por ter ela assassinado o “fruto do seu pecado», de cumplicidade com o amante. Apesar de pretextar inocência, Celina quase foi parar na prisão, pois a própria irmã testemunhou contra ela afirmando que estivera real e visivelmente grávida. Contudo, o exame pericial requerido constatou esterilidade, concluindo assim o relatório: “Gravidez ilusória sob império de alucinações dum psiquismo acometido de monomania”.
Outro caso igual se passou com Adele C., sendo apenas que esta não se livrou da condenação. Depois de 4 anos de reclusão o inquérito foi reaberto. Uma enfermeira do Hospital Tenon testemunhou a mania de Adele de se passar por grávida e um laudo com cinco assinaturas confirmou esse testemunho, concluindo-se pela gravidez histérica.
O mesmo Gustave Joseph Witkowski reproduz ainda as palavras de Mme. Junot, esposa de Junot, homem de confiança de Napoleão Bonaparte, quando ela diz que já estava no 5° mês de gestação e, ao viajar ao encontro do marido, no trem, o ventre abaixou completamente, enquanto a sua empregada ria a valer. Diante do fato ela procurou o Dr. Magnien, que lhe diagnosticou uma “gravidez ... de vento” (timpanite).
Axel Martin Fredrik Munthe, à pág. 253 do seu popularíssimo “Boken om San Michele” (“O Livro de San Michele”), tradução de Jayme Cortezão, Porto Alegre, 1938), romanceou um caso verídico de gravidez histérica que lhe caiu nas mãos. Ele fora procurado pela viúva do reverendo Jonathan, falecido há mais de 10 anos, que lhe confessou estar grávida. Examinando-a, viu tratar-se de simples simulação de gravidez, advinda, muito provavelmente, do desejo de justificar sua esterilidade, pondo a culpa no reverendo Jonathan, que falecera já octogenário, de encefalomalácia (amolecimento cerebral). Axel Munthe contestou a gravidez, e a cliente, revoltada, trocou de médico. A colônia inglesa dividira-se em dois campos, após ouvir a opinião do Dr. Pilkington. Um dia o caso se deslindou... A criança não nasceu, muito menos os gêmeos prognosticados pelo abalizado Dr. Pilkington.
O Dr. Frederic Loomis, em “The Bond Between us” (“Novas Confissões dum Médico de Senhoras”, tradução do Dr. Elias Davidovich, Livraria O Globo, 1944), pág. 89, narra:
“Um dia trouxeram-me uma mulher na iminência de dar à luz. Parecia tratar-se de gêmeos, tal o volume do ventre. Percutindo-o, era mais timpânico (de tambor, de gases) do que maciço (de criança, duro). O tamanho do útero também era abaixo do normal. Disse à minha cliente, sob protestos injuriosos, que não ia ter filhos. Uma radiografia tirada não deu feto algum. Ainda assim só se convenceu após anestesia pelo éter que fez com que o ventre baixasse ao normal, ficando chato como uma panqueca”.
No seu livro “Lições de Clínica Obstétrica”, aqui já citado, Clóvis Correia da Costa conta o caso duma senhora idosa que se sentiu grávida e, já no 8º mês, com perdas sanguíneas, teve de repousar a fim de não perder a criança. Esta já se mexia muito. O médico, porém, estranhou que nunca ouvisse batimentos fetais. “Já no segundo exame desconfiamos e da desconfiança fomos a um exame melhor e à certeza de tratar-se de gravidez imaginária. Aconselhamos radiografia que não foi feita. Lá um ia, dores violentíssimas prenunciaram o parto, e como não se dilatasse o colo, outro colega, pois estávamos de viagem, pela radiografia, confirmou o nosso diagnóstico; a parturiente nunca esteve grávida, pois”.
Napoleão Teixeira, em ”Gravidez Imaginária” (Contribuição ao Estudo da Pseudociese do ponto de vista Médico-Legal), separata da “Publicações Médicas", n." 175, fevereiro de 1950, SP, descreve:
“Em abril de 1946, uma senhora com seu filho único já adolescente entrou em nosso consultório. Tinha grande desejo de ter um filho que viria rearmonizar seu lar, pois não era menor o desejo do marido nisso. A cliente era filha de pais excessivamente nervosos. Enfeitam seus antecedentes convulsões, paralisias, etc. Faltaram-lhe as regras num mês e noutros seguintes. A criança já tinha movimentos. O enxovalzinho foi confeccionado com carinho e a família ficou à espera da festinha. No fim dos nove meses, dores violentas prenunciaram que o momento do parto era chegado. Mas as cólicas apareciam e reapareciam e nada de nascer a criança. O marido, já desconfiado, levou-a a um psiquiatra, deste voltou ao obstetra com o diagnóstico de falsa gravidez. Já ostentava a nossa cliente o mais belo dos perfis. O ventre de nono mês estava normalíssimo”.
Existe, também, nos anais da crônica médica brasileira, um caso que é dos mais extraordinários e que ficou famoso por volta do ano de 1948, na cidade de Poços de Caldas, em Minas Gerais. Os jornais e revistas da época muito se ocuparam do assunto, em especial o Dr. José Ayres de Paiva, talentoso médico que a respeito publicou interessante diagnóstico médico, muito bem fundamentado, a fim de demonstrar que o fenômeno nada tinha de sobrenatural, como pretendiam a causadora, a imprensa, os místicos e a crença popular. Tratava-se de Jandira Gonçalves Pereira, que chegou a publicar um livro intitulado “Almas Gêmeas”, no qual confessava sua crença de que daria à luz outro Cristo, mediante “acumulação fluídica” (mesmo processo descrito por Roustaing relativamente a Jesus), já que não tinha motivos para aceitar que houvesse concebido normalmente. A paciente e autora fala em “turbilhão de emoções e sensações desconhecidas que, de repente explodem, sem que possamos controlar” (pág. 13). “Sentia que do quadril para baixo eu estava paralisada” (pág. 26). “Meu ventre cresceu como uma gravidez de 4 meses, em 7 dias” (pág. 27). “Comecei a ter leite, as glândulas mamárias se desenvolveram como no estado geral das gestantes” (pág. 27). Do matutino paulista “O Dia”, de 20-04-1948, e do “Diário de Minas”, de 12-02-1953, recolho mais os seguintes detalhes:
“Em janeiro de 1948, antes do início da primeira acumulação fluídica, surgiram-me chagas em ambas as mãos, as quais, doendo fortemente, sangraram durante 15 dias”. “Tenho amenorreia, movimento fetal, desejo, medo, agitação nervosa, tudo isso eu tenho”. “Anunciou a gravidez fluídica para daí a 7 dias e efetivamente a 27 daquele mês teve início o fenômeno. Seis meses após processou-se o funcionamento das glândulas mamárias. Em novembro do mesmo fui avisada, pelo mentor, que o que eu tinha no ventre não era feto, mas apenas fluidos”. “A primeira gravidez fluídica deu-se em 27 de abril de 1948, durante 15 meses. Naquele período foram tiradas chapas radiográficas, confirmando a gravidez fluídica. Não encontraram os médicos elemento de gravidez material ou comum. O segundo período de 8 a 14 de junho de 1950. O terceiro, de 8 a 18; o quarto, de 8 a 23 de março de 1951 e, este, cuja duração não se pode prever”. “O leite na primeira manifestação surgiu ... mas depois o meu seio tem-se colocado em posição inalterável”. “Porque se trata de fluidos, por conseguinte não pode haver presença fetal”, “Uma vez sentia as pernas inchadas... amenorreia, movimento fetal, desejo, agitação nervosa. Tudo isso tenho”. “No dia 27, qual não foi minha surpresa ao notar o crescimento do ventre.”
O Dr. José Ayres de Paiva, que estudou exaustivamente o caso, diagnosticou-o à pág. 16 do seu livro “Mães de Jeovás”, nos seguintes termos:
“A falsa gravidez histérica está aí, acima, confessada de maneira ampla, clara, insofismável. Trata-se de uma gravidez histérica!” “o mecanismo da distensão abdominal de D. Jandira Gonçalves Pereira é exatamente o mesmo dos casos de falsa timpanite histérica relatados por Bernheim, isto é, por auto sugestão consciente ou inconsciente, prolaba ou distende a cúpula diafragmática para dentro da cavidade abdominal, baixando o fígado e empurrando as alças intestinais para baixo e para a frente”.
Ao final do seu trabalho, o autor, que inclusive - o que, no caso, é muito compreensível - procura demonstrar que o fenômeno de Jandira Gonçalves Pereira nada tem de sobrenatural ou de origem fluídica, apresenta algumas conclusões essenciais, dentre as quais: Esses fenômenos “são naturalíssimos, encontram cabal explicação à luz da medicina” (pág. 23). “Versam matéria médica e não mística” ( pág. 23). “Tais casos enquadram-se na psiquiatria, no capítulo da histeria, com ou sem delírios episódicos”. “Já existiram muitos outros ( ... ) na história da medicina psiquiátrica e obstétrica, e na medicina romanceada”. “Todos esses casos são de falsa gravidez ou de falsa timpanite histérica, inclusive o de D. Jandira Gonçalves Pereira” (pág. 24).
Restaria apenas, antes das minhas considerações finais, transferir ao leitor a explicação fornecida por Hippolyte Bernheim, citando seu colega Talma d'Utbecht, para a mecânica do fenômeno:
“Talma achou um ventre grande, timpânico, duro. Durante o sono, fica distendido um pouco menos. A respiração é quase exclusivamente costal, alta. O cateterismo gástrico pela sonda dá poucos gases. Durante a anestesia, de costal passava a respiração acosto-abdominal. Depois da anestesia, quando o ventre vai timpanizar-se, constatam-se 4 a 5 inspirações exclusivamente abdominais, sem relaxamento expiratório até quando o ventre volte ao normal. O diafragma não se relaxa, a respiração é puramente costal. O diafragma e o bordo inferior do pulmão eram muito baixos, na linha axilar, ao nível da décima costela. Sob clorofórmio, baixa o ventre e sobe o fígado. As observações de Talma coincidem com as minhas com relação ao mecanismo que produz as falsas timpanites, isto é, o abaixamento diafragmático, de origem essencialmente psíquica, por auto sugestão, constitui o mesmo mecanismo da falsa gravidez histérica”.
Bem, aí está, meu caro leitor, toda a história da “pseudociésis” e da falsa timpanite histérica. É história provada e comprovada, exceto - como já frisei - quanto à origem histérica, que não apenas é controvertida entre os próprios médicos, como de resto, nós, os espíritas, a desprezamos completamente. No mais, a história é tão antiga que dela já falava Hipócrates, o Pai da Medicina, em seus “Les Aphorismes”:
“Quando uma mulher que não está gravida, nem convalesce de parto, tem leite, suas regras estão suspensas” (cap. V, § XXXIX) e “numa mulher o afluxo de sangue às mamas pressagia a mania» (cap. XL).
Ao encerrar este artigo, depois de transcrever tantos casos a respeito, quero referir o mais importante de todos, o mais grave, o mais sério, o mais altanado, o mais sublime caso de “pseudociésis» que a humanidade conhece e que difere dos demais porque revestiu características carismáticas e culminou de forma diferente: ao término do processo, materializou-se, ao lado da parturiente, a figura dum agênere... Leiamos com amor e emoção a belíssima narrativa desse caso singular:
“No sexto mês foi o anjo Gabriel enviado, da parte de Deus, para uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com certo homem da casa de Davi, cujo nome era José; a virgem chamava-se Maria. E, entrando o anjo onde ela estava, disse: Salve! agraciada; o Senhor é contigo. Bendita és tu entre as mulheres. Ela, porém, ao ouvir esta palavra, perturbou-se muito e pôs-se a pensar no que significaria esta saudação. Mas o anjo lhe disse: Maria, não temas; porque achaste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho a quem chamarás pelo nome de Jesus. Este será grande e será chamado Filho do Altíssimo; Deus, o Senhor, lhe dará o trono de Davi, seu pai; ele reinará para sempre sobre a casa de Jacó, e o seu reino não terá fim. Então disse Maria ao anjo: Como será isto, pois não tenho relação com homem algum? Respondeu-lhe o anjo: Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso também o ente santo que há de nascer será chamado Filho de Deus. E Isabel, tua parenta, igualmente concebeu um filho na sua velhice, sendo este já o sexto mês para aquela que diziam ser estéril. Porque para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas. Então disse Maria: Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra. E o anjo se ausentou dela. Naqueles dias, dispondo-se Maria, foi apressadamente à região montanhosa, a uma cidade de Judá, entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel. Ouvindo esta a saudação de Maria, a criança lhe estremeceu no ventre; então Isabel ficou possuída do Espírito Santo. E exclamou em alta voz: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito o fruto do teu ventre” (Lucas, cap. I, vers. 26 a 42).
Em mais este dezembro, agradeço-te, Maria, a abençoada claridade que permitiste entrar em meu coração, alijando-me do raciocínio terríveis dúvidas do passado e conduzindo-me, através de Roustaing, a entender-te o papel sublime junto ao Cristo, de mãe amorosa e desprendida, realmente sem mácula, não obstante o “nascimento” de teu filho, sendo José de avançada idade ...
Luciano dos Anjos
Reformador (FEB) Dezembro 1970
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