MATEUS, Cap. XII, v. 46-50. — MARCOS, Cap. III, v. 31-35. —LUCAS, Cap. VIII, v. 19-21
O irmão, a irmã e a mãe de Jesus são os que fazem a vontade de seu pai, ouvindo a palavra de Deus e pondo-a em prática.
MATEUS: V. 46. Estando ele ainda a pregar para a multidão, sua mãe e seus irmãos do lado de fora procuravam falar-lhe. — 47. Então alguém lhe disse: Tua mãe e teus irmãos estão ali fora procurando-te. — 48. Respondendo a esse que assim falara, disse ele: Quem é minha mãe e quais os meus irmãos? — 49. E, estendendo a mão para os discípulos, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; — 50, porquanto, quem quer que faça a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.
MARCOS: V. 31. Sua mãe e seus irmãos, tendo vindo e ficado do lado de fora, o mandaram chamar. — 32. Ora, como a multidão o cercasse, alguém lhe disse: Olha que tua mãe e teus irmãos te procuram. — 33. Ao que perguntou ele: Quem é minha mãe e quais são os meus irmãos? — 34. E, olhando para os que se achavam sentados ao redor de si, disse: Eis aqui minha mãe e meus irmãos; — 35, porquanto, aquele que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.
LUCAS: V. 19. Sua mãe e seus irmãos vieram ter com ele, mas não puderam aproximar-se dele por causa da multidão. — 20. Disseram-lhe então: Estão lá fora tua mãe e teus irmãos que te querem ver. — 21. Jesus, respondendo, disse: Minha mãe e meus irmãos são os que escutam a palavra de Deus e a praticam.
Não estando ligado a Maria por nenhum laço humano, Jesus patenteava aos homens os sentimentos de fraternidade e de amor que os deviam unir.
Efetivamente, qual poderia ser o desejo do bom pastor que vinha à procura das ovelhas tresmalhadas? qual poderia ser o seu objetivo? — Reuni-Ias em torno de si. Todas, fossem quais fossem, eram dele bem-amadas.
Sendo, com relação aos homens, pela sua pureza e pelo seu poder, filho único do pai e vindo dizer-lhes: Sois todos, como eu, filhos de Deus, Jesus precisava demonstrar que punha em prática os ensinamentos que dava à multidão e provar que todos os seres humanos são de fato filhos de Deus e, por isso, irmãos dele Jesus, enquanto caminham nas vias do Senhor.
Referindo-nos a Jesus, acabamos de usar das expressões —filho único do pai. Ele o era e é, no sentido de ser, pela sua elevação espiritual, única relativamente à de todos os Espíritos que se acham ligados ao vosso planeta, quem lhe preside aos destinos. Desse ponto de vista e comparado a vós outros, Jesus pode e deve, já o temos dito, ser considerado filho único do Senhor. Sua essência pura, que nunca se desviou da linha do progresso, se aproxima da natureza do Criador universal. Seu poder ilimitado sobre quanto concerne ao orbe terreno participa do poder do supremo Senhor, com o qual ele, pela sua pureza, se acha em relação direta.
Maria e os chamados irmãos de Jesus o foram procurar, induzidos pela influência espírita de seus anjos da guarda e também levados pela idéia de que, devendo o Mestre atender à necessidade de alimentar o corpo, lhes cumpria ir à sua procura, para esse fim.
Conquanto fosse um Espírito muito elevado, Maria estava, até certo ponto, submetida à matéria que a envolvia e não compreendia que Jesus pudesse resistir a tão grandes fadigas sem tomar os alimentos que sustentam o corpo.
Tinha ela a intuição da sua sorte futura; mas, o passado se lhe apresentava, como a vós, coberto por um véu, o véu da carne.
Nunca será demais que repitamos, pois não o deveis perder de vista, o seguinte: Em virtude da revelação que lhes fora feita e que se conservou secreta, como devia acontecer, até depois de finda a missão terrena de Jesus, este, para Maria e para José, era um ente excepcional, grande aos olhos de Deus, por ser filho do mesmo Deus, e que encarnara milagrosamente, mas sem deixar de participar da natureza do homem e de estar sujeito às exigências, às necessidades da humana existência. Para os homens, ele era um homem igual aos outros, filho, por obra humana, de José e de Maria e como tal o consideraram enquanto durou a sua missão terrena e até à época em que, já finda essa missão, aquela revelação se tornou conhecida do povo.
A ida de Maria e dos chamados irmãos de Jesus à procura deste lhes foi inspirada para provocar, como provocou, a observação do Mestre.
Ao que lhe dissera: "Tua mãe e teus irmão te procuram", ele respondeu inquirindo: "Quem é minha mãe e quem são meus irmãos"? E acrescentou, apontando para os discípulos:. "Eis aqui minha mãe e meus irmãos, pois que aquele que houver feito a vontade de meu pai, a vontade de Deus — esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe; minha mãe e meus ir-mãos são os que escutam a palavra de Deus e a põem em prática".
As versões de Mateus, Marcos e Lucas são exatas e se completam umas pelas outras: Jesus apontou com a mão para os discípulos que o cercavam e respondeu, deixando cair sobre o povo a atração poderosa do seu olhar, irradiação magnética que atraía os homens como o ímã atrai o ferro. Por esse gesto ele apresentava seus discípulos como exemplo e atraía para eles a multidão que os teria de imitar.
Ao dar aquela resposta, o presente e o futuro se confundiam no seu pensamento. Deu-a, tendo por fim, atento o motivo que determinara a ida de Maria e dos que eram designados por irmãos dele, provar que a missão, a cujo desempenho se consagrara no meio dos homens, sobrelevava aos laços da família humana, às necessidades da natureza humana, que, no entender dos mesmos homens, se lhe faziam sentir. Em todas as ocasiões feria as inteligências.
Tinha também por fim, atentas as palavras que lhe eram dirigidas, mostrar veladamente que nenhum laço humano o prendia a Maria, nem, por conseguinte, àqueles com quem o supunham ligado por humano parentesco. Quis mostrar que não o ligava a Maria, nem aos que eram tidos por seus irmãos, nem aos seus discípulos, nem à multidão que o rodeava, senão um laço espiritual, um parentesco espiritual, um laço de parentesco e de fraternidade segundo o espírito e não segundo a carne: Quis ainda mostrar que mesmo esse parentesco e essa fraternidade, segundo o espírito, entre ele e os homens, assim como entre estes de uns para os outros, não eram reais nem verdadeiros, senão relativamente aos que houvessem feito a vontade divina, escutando e pondo em prática a palavra de Deus, de quem era ele o representante e o órgão.
Tinha igualmente por fim preparar os homens para, nos tempos preditos, receberem a nova revelação, que hoje vos trazemos e que, tirando da letra o espírito, lhes faria conhecer, em espírito e verdade, a sua origem espírita, as condições e o modo por que se deu o seu aparecimento na terra, sua missão, sua potencialidade e seus poderes como delegado e representante do pai, no que diz respeito ao vosso planeta, a cuja formação presidiu, tendo por encargo dirigir-lhe o progresso e levá-lo à realização de seus destinos, conduzindo a humanidade terrena à perfeição pelas vias do progresso, que são a caridade, o amor e a ciência. Por essa nova revelação, ficarão os homens sabendo, em espírito e verdade. que ele Jesus é de todos irmão e ao mesmo tempo senhor, pelo poder ilimitado que tem sobre quanto respeita ao mundo em que habitais.
Tinha, pois, também por fim preparar os homens para, quando chegasse o momento, abandonarem, esclarecidos pela nova revelação, a crença na sua divindade, crença que, previa-o ele, se havia de generalizar, uma vez terminada a sua missão terrena; de acordo com o estado das inteligências, com as impressões, aspirações e interpretações humanas, assim como com as necessidades da época. Correspondendo a essas necessidades e servindo para preparar os tempos de hoje, que então eram o futuro, para preparar o advento da era que se vos abre, tal crença seria, como foi, uma condição e um meio de progresso.
Disseram a Jesus: "Tua mãe e teus irmãos te procuram". Confrontando essas palavras com estas outras (Mateus, XIII, v. 55): "Não é esse o filho do carpinteiro; sua mãe não se chama Maria; não são seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas?" com estas (Mateus, XIII, v. 56): "E todas as suas irmãs não se acham entre nós?" com estas ainda (Marcos, VI, v. 3): "Não é esse o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão?" e com estas mais (Mateus, I, v. 25): "E ele (José) não a tinha conhecido quando ela pariu o seu primogênito, ao qual deu o nome de Jesus" — pretenderam alguns homens e ainda pretendem poder afirmar que Jesus teve irmãos e irmãs por obra de José e de Maria.
Há nisso um erro manifesto que, após as discussões travadas outrora e mesmo nos dias de hoje, não mais devera reproduzir-se. Diante da nova revelação no que respeita à origem espírita de Jesus, ao seu aparecimento na terra, à natureza e ao caráter da sua missão no passado, no presente e no futuro, à elevação e à pureza de Maria e de José, à natureza e ao caráter da missão que os dois desempenharam, auxiliando a obra do Mestre, semelhante erro tem que desaparecer dos debates e controvérsias humanas.
Só aos olhos dos homens, mas não na realidade das coisas, existia parentesco próximo entre Jesus e os que eram chamados seus irmãos e irmãs.
Em hebreu a palavra — irmão — tinha várias acepções. Significava, ao mesmo tempo, o irmão propriamente dito, o primo co-irmão, o simples parente. Entre os Hebreus, os descendentes diretos da mesma linha eram considerados irmãos, se não de fato, ao menos de nome e se confundiam muitas vezes, tratando-se indistintamente de irmãos e irmãs. Geralmente se designavam pelo nome de irmãos os que eram filhos de pais-irmãos, os que agora chamais primos-irmãos.
Os chamados irmãos e irmãs de Jesus eram, segundo o parentesco humano que entre eles havia aos olhos dos homens, seus primos-irmãos.
Maria não era filha única; tinha uma irmã, que também se chamava Maria, mulher de Cleofas e mãe de Tiago, de José, de Simão e de Judas, que os homens tratavam de irmãos de Jesus.
Do mesmo modo, as chamadas irmãs deste eram suas primas co-irmãs, de acordo com o parentesco humano que, segundo os homens, havia entre elas e o Mestre.
Que importaria aos homens que Jesus tivesse tido irmãos e irmãs na humanidade, uma vez que a essência deles não podia ser igual à do Mestre, Espírito perfeito, que encarnara, para ser visto dos mesmos homens, tomando um perispírito tangível, com a forma ou a aparência do corpo humano, adequado às necessidades e à duração dá sua missão terrena?
Tal, porém, não podia dar-se e não se deu. Espíritos muito elevados, José e Maria sofriam o constrangimento do envoltório carnal que haviam aceitado, mas não estavam sujeitos a instintos de que já se haviam libertado. Exilados momentaneamente da verdadeira pátria, dela guardavam intuitivamente a lembrança e um único era o anelo de ambos: voltar para lá.
Nunca se deve acompanhar o curso de um rio de águas impuras. Deixai que os ímpios desnaturem os fatos mais sérios. Repetimos: Espíritos muito elevados, encarnados em missão, José e Maria não experimentavam as necessidades carnais da humanidade. Intuitivamente preparada para a missão que lhe cumpria desempenhar na execução daquela grande obra de regeneração, cujo desenlace constituiu exemplo para todas as raças humanas que, a partir de então, se sucederam, Maria foi e permaneceu sempre virgem. José, menos elevado do que ela, mas desempenhando também uma missão sagrada, compreendeu, pela revelação do anjo, qual o objeto da sua existência material e a ele se consagrou inteiramente.
Com a locução — "filho primogênito" — em que alguns homens se apoiaram para atribuir a Maria muitos filhos, verifica-se o que acabamos de apreciar com relação aos vocábulos — irmãos, irmãs. As interpretações humanas truncaram em falso. Filho primogênito o mesmo é que filho único, no verdadeiro sentido da palavra hebraica. Quando um único filho havia nascido, esse necessariamente era o primeiro. Ide ao texto hebreu, à língua hebraica, investigai a maneira por que os Hebreus dela usavam e achareis a significação exata das palavras.
Eles empregavam indiferentemente, na sua linguagem, a locução filho primogênito, tanto no caso de haver um só filho, como no de haver muitos, quando aludiam ao que primeiro nascera, quer outros tivessem nascido depois, quer não.
No verdadeiro sentido da frase hebraica (Mateus, I, v. 25), a locução filho primogênito significa apenas que Maria não tivera antes outro filho. Jesus era, pois, o primogênito. O autor não previu as considerações e interpretações a que tal locução daria lugar. Sob este aspecto, sua contextura é defeituosa para o vosso entendimento.
O v. 25 do cap. I de Mateus teve por fim, exclusivamente, confirmar o que fora dito nos v. 18 e 24, resumindo o que deles se deduz, isto é: que José não tomou parte alguma na concepção do filho de Maria, nessa obra do Espírito Santo; que não se aproximara dela; que aquela concepção fora obra exclusiva do Espírito Santo. Já sabeis pela revelação que vos fizemos do modo por que Jesus apareceu na terra, o que significam essas palavras: — concepção por obra do Espírito Santo.
Assim, pois, a locução "filho primogênito" não objetivava senão certificar que Maria concebera sendo virgem. Absolutamente não foi empregada para exprimir a prioridade do nascimento de um irmão entre muitos, para registrar a primogenitura de um deles, fato que, na vossa jurisprudência, política, ou feudal, conferia, sob o título de "direitos de primogenitura", certos privilégios ao irmão mais velho.
Pelo que vos revelamos com relação à gravidez e ao parto de Maria, sabeis agora como se conservou ela virgem, não obstante a gravidez e o parto, pois sabeis que estes, como obra do Espírito Santo, como obra espírita, realizada por meio do magnetismo espiritual, foram apenas aparentes, tomando-os ela, entretanto, e os homens por fatos reais.
Jesus, portanto, sendo "filho primogênito", era o que chamais "filho único". Terminada a sua missão terrena, os Hebreus, por não quererem admitir que o Mestre tivesse tido a vida especial que lhe atribuíam não só a revelação que, conservada até então secreta, se tornara conhecida do povo, mas ainda as interpretações a que essa revelação dera lugar, tomaram a locução primogênito como indicando que ao de Jesus se seguiram outros nascimentos.
Vós outros cristãos vos apegastes ao sentido verdadeiro, que é o de filho único. Eis aí a explicação destas palavras de que nos servimos: — o que chamais filho único.
Efetivamente, qual poderia ser o desejo do bom pastor que vinha à procura das ovelhas tresmalhadas? qual poderia ser o seu objetivo? — Reuni-Ias em torno de si. Todas, fossem quais fossem, eram dele bem-amadas.
Sendo, com relação aos homens, pela sua pureza e pelo seu poder, filho único do pai e vindo dizer-lhes: Sois todos, como eu, filhos de Deus, Jesus precisava demonstrar que punha em prática os ensinamentos que dava à multidão e provar que todos os seres humanos são de fato filhos de Deus e, por isso, irmãos dele Jesus, enquanto caminham nas vias do Senhor.
Referindo-nos a Jesus, acabamos de usar das expressões —filho único do pai. Ele o era e é, no sentido de ser, pela sua elevação espiritual, única relativamente à de todos os Espíritos que se acham ligados ao vosso planeta, quem lhe preside aos destinos. Desse ponto de vista e comparado a vós outros, Jesus pode e deve, já o temos dito, ser considerado filho único do Senhor. Sua essência pura, que nunca se desviou da linha do progresso, se aproxima da natureza do Criador universal. Seu poder ilimitado sobre quanto concerne ao orbe terreno participa do poder do supremo Senhor, com o qual ele, pela sua pureza, se acha em relação direta.
Maria e os chamados irmãos de Jesus o foram procurar, induzidos pela influência espírita de seus anjos da guarda e também levados pela idéia de que, devendo o Mestre atender à necessidade de alimentar o corpo, lhes cumpria ir à sua procura, para esse fim.
Conquanto fosse um Espírito muito elevado, Maria estava, até certo ponto, submetida à matéria que a envolvia e não compreendia que Jesus pudesse resistir a tão grandes fadigas sem tomar os alimentos que sustentam o corpo.
Tinha ela a intuição da sua sorte futura; mas, o passado se lhe apresentava, como a vós, coberto por um véu, o véu da carne.
Nunca será demais que repitamos, pois não o deveis perder de vista, o seguinte: Em virtude da revelação que lhes fora feita e que se conservou secreta, como devia acontecer, até depois de finda a missão terrena de Jesus, este, para Maria e para José, era um ente excepcional, grande aos olhos de Deus, por ser filho do mesmo Deus, e que encarnara milagrosamente, mas sem deixar de participar da natureza do homem e de estar sujeito às exigências, às necessidades da humana existência. Para os homens, ele era um homem igual aos outros, filho, por obra humana, de José e de Maria e como tal o consideraram enquanto durou a sua missão terrena e até à época em que, já finda essa missão, aquela revelação se tornou conhecida do povo.
A ida de Maria e dos chamados irmãos de Jesus à procura deste lhes foi inspirada para provocar, como provocou, a observação do Mestre.
Ao que lhe dissera: "Tua mãe e teus irmão te procuram", ele respondeu inquirindo: "Quem é minha mãe e quem são meus irmãos"? E acrescentou, apontando para os discípulos:. "Eis aqui minha mãe e meus irmãos, pois que aquele que houver feito a vontade de meu pai, a vontade de Deus — esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe; minha mãe e meus ir-mãos são os que escutam a palavra de Deus e a põem em prática".
As versões de Mateus, Marcos e Lucas são exatas e se completam umas pelas outras: Jesus apontou com a mão para os discípulos que o cercavam e respondeu, deixando cair sobre o povo a atração poderosa do seu olhar, irradiação magnética que atraía os homens como o ímã atrai o ferro. Por esse gesto ele apresentava seus discípulos como exemplo e atraía para eles a multidão que os teria de imitar.
Ao dar aquela resposta, o presente e o futuro se confundiam no seu pensamento. Deu-a, tendo por fim, atento o motivo que determinara a ida de Maria e dos que eram designados por irmãos dele, provar que a missão, a cujo desempenho se consagrara no meio dos homens, sobrelevava aos laços da família humana, às necessidades da natureza humana, que, no entender dos mesmos homens, se lhe faziam sentir. Em todas as ocasiões feria as inteligências.
Tinha também por fim, atentas as palavras que lhe eram dirigidas, mostrar veladamente que nenhum laço humano o prendia a Maria, nem, por conseguinte, àqueles com quem o supunham ligado por humano parentesco. Quis mostrar que não o ligava a Maria, nem aos que eram tidos por seus irmãos, nem aos seus discípulos, nem à multidão que o rodeava, senão um laço espiritual, um parentesco espiritual, um laço de parentesco e de fraternidade segundo o espírito e não segundo a carne: Quis ainda mostrar que mesmo esse parentesco e essa fraternidade, segundo o espírito, entre ele e os homens, assim como entre estes de uns para os outros, não eram reais nem verdadeiros, senão relativamente aos que houvessem feito a vontade divina, escutando e pondo em prática a palavra de Deus, de quem era ele o representante e o órgão.
Tinha igualmente por fim preparar os homens para, nos tempos preditos, receberem a nova revelação, que hoje vos trazemos e que, tirando da letra o espírito, lhes faria conhecer, em espírito e verdade, a sua origem espírita, as condições e o modo por que se deu o seu aparecimento na terra, sua missão, sua potencialidade e seus poderes como delegado e representante do pai, no que diz respeito ao vosso planeta, a cuja formação presidiu, tendo por encargo dirigir-lhe o progresso e levá-lo à realização de seus destinos, conduzindo a humanidade terrena à perfeição pelas vias do progresso, que são a caridade, o amor e a ciência. Por essa nova revelação, ficarão os homens sabendo, em espírito e verdade. que ele Jesus é de todos irmão e ao mesmo tempo senhor, pelo poder ilimitado que tem sobre quanto respeita ao mundo em que habitais.
Tinha, pois, também por fim preparar os homens para, quando chegasse o momento, abandonarem, esclarecidos pela nova revelação, a crença na sua divindade, crença que, previa-o ele, se havia de generalizar, uma vez terminada a sua missão terrena; de acordo com o estado das inteligências, com as impressões, aspirações e interpretações humanas, assim como com as necessidades da época. Correspondendo a essas necessidades e servindo para preparar os tempos de hoje, que então eram o futuro, para preparar o advento da era que se vos abre, tal crença seria, como foi, uma condição e um meio de progresso.
Disseram a Jesus: "Tua mãe e teus irmãos te procuram". Confrontando essas palavras com estas outras (Mateus, XIII, v. 55): "Não é esse o filho do carpinteiro; sua mãe não se chama Maria; não são seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas?" com estas (Mateus, XIII, v. 56): "E todas as suas irmãs não se acham entre nós?" com estas ainda (Marcos, VI, v. 3): "Não é esse o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão?" e com estas mais (Mateus, I, v. 25): "E ele (José) não a tinha conhecido quando ela pariu o seu primogênito, ao qual deu o nome de Jesus" — pretenderam alguns homens e ainda pretendem poder afirmar que Jesus teve irmãos e irmãs por obra de José e de Maria.
Há nisso um erro manifesto que, após as discussões travadas outrora e mesmo nos dias de hoje, não mais devera reproduzir-se. Diante da nova revelação no que respeita à origem espírita de Jesus, ao seu aparecimento na terra, à natureza e ao caráter da sua missão no passado, no presente e no futuro, à elevação e à pureza de Maria e de José, à natureza e ao caráter da missão que os dois desempenharam, auxiliando a obra do Mestre, semelhante erro tem que desaparecer dos debates e controvérsias humanas.
Só aos olhos dos homens, mas não na realidade das coisas, existia parentesco próximo entre Jesus e os que eram chamados seus irmãos e irmãs.
Em hebreu a palavra — irmão — tinha várias acepções. Significava, ao mesmo tempo, o irmão propriamente dito, o primo co-irmão, o simples parente. Entre os Hebreus, os descendentes diretos da mesma linha eram considerados irmãos, se não de fato, ao menos de nome e se confundiam muitas vezes, tratando-se indistintamente de irmãos e irmãs. Geralmente se designavam pelo nome de irmãos os que eram filhos de pais-irmãos, os que agora chamais primos-irmãos.
Os chamados irmãos e irmãs de Jesus eram, segundo o parentesco humano que entre eles havia aos olhos dos homens, seus primos-irmãos.
Maria não era filha única; tinha uma irmã, que também se chamava Maria, mulher de Cleofas e mãe de Tiago, de José, de Simão e de Judas, que os homens tratavam de irmãos de Jesus.
Do mesmo modo, as chamadas irmãs deste eram suas primas co-irmãs, de acordo com o parentesco humano que, segundo os homens, havia entre elas e o Mestre.
Que importaria aos homens que Jesus tivesse tido irmãos e irmãs na humanidade, uma vez que a essência deles não podia ser igual à do Mestre, Espírito perfeito, que encarnara, para ser visto dos mesmos homens, tomando um perispírito tangível, com a forma ou a aparência do corpo humano, adequado às necessidades e à duração dá sua missão terrena?
Tal, porém, não podia dar-se e não se deu. Espíritos muito elevados, José e Maria sofriam o constrangimento do envoltório carnal que haviam aceitado, mas não estavam sujeitos a instintos de que já se haviam libertado. Exilados momentaneamente da verdadeira pátria, dela guardavam intuitivamente a lembrança e um único era o anelo de ambos: voltar para lá.
Nunca se deve acompanhar o curso de um rio de águas impuras. Deixai que os ímpios desnaturem os fatos mais sérios. Repetimos: Espíritos muito elevados, encarnados em missão, José e Maria não experimentavam as necessidades carnais da humanidade. Intuitivamente preparada para a missão que lhe cumpria desempenhar na execução daquela grande obra de regeneração, cujo desenlace constituiu exemplo para todas as raças humanas que, a partir de então, se sucederam, Maria foi e permaneceu sempre virgem. José, menos elevado do que ela, mas desempenhando também uma missão sagrada, compreendeu, pela revelação do anjo, qual o objeto da sua existência material e a ele se consagrou inteiramente.
Com a locução — "filho primogênito" — em que alguns homens se apoiaram para atribuir a Maria muitos filhos, verifica-se o que acabamos de apreciar com relação aos vocábulos — irmãos, irmãs. As interpretações humanas truncaram em falso. Filho primogênito o mesmo é que filho único, no verdadeiro sentido da palavra hebraica. Quando um único filho havia nascido, esse necessariamente era o primeiro. Ide ao texto hebreu, à língua hebraica, investigai a maneira por que os Hebreus dela usavam e achareis a significação exata das palavras.
Eles empregavam indiferentemente, na sua linguagem, a locução filho primogênito, tanto no caso de haver um só filho, como no de haver muitos, quando aludiam ao que primeiro nascera, quer outros tivessem nascido depois, quer não.
No verdadeiro sentido da frase hebraica (Mateus, I, v. 25), a locução filho primogênito significa apenas que Maria não tivera antes outro filho. Jesus era, pois, o primogênito. O autor não previu as considerações e interpretações a que tal locução daria lugar. Sob este aspecto, sua contextura é defeituosa para o vosso entendimento.
O v. 25 do cap. I de Mateus teve por fim, exclusivamente, confirmar o que fora dito nos v. 18 e 24, resumindo o que deles se deduz, isto é: que José não tomou parte alguma na concepção do filho de Maria, nessa obra do Espírito Santo; que não se aproximara dela; que aquela concepção fora obra exclusiva do Espírito Santo. Já sabeis pela revelação que vos fizemos do modo por que Jesus apareceu na terra, o que significam essas palavras: — concepção por obra do Espírito Santo.
Assim, pois, a locução "filho primogênito" não objetivava senão certificar que Maria concebera sendo virgem. Absolutamente não foi empregada para exprimir a prioridade do nascimento de um irmão entre muitos, para registrar a primogenitura de um deles, fato que, na vossa jurisprudência, política, ou feudal, conferia, sob o título de "direitos de primogenitura", certos privilégios ao irmão mais velho.
Pelo que vos revelamos com relação à gravidez e ao parto de Maria, sabeis agora como se conservou ela virgem, não obstante a gravidez e o parto, pois sabeis que estes, como obra do Espírito Santo, como obra espírita, realizada por meio do magnetismo espiritual, foram apenas aparentes, tomando-os ela, entretanto, e os homens por fatos reais.
Jesus, portanto, sendo "filho primogênito", era o que chamais "filho único". Terminada a sua missão terrena, os Hebreus, por não quererem admitir que o Mestre tivesse tido a vida especial que lhe atribuíam não só a revelação que, conservada até então secreta, se tornara conhecida do povo, mas ainda as interpretações a que essa revelação dera lugar, tomaram a locução primogênito como indicando que ao de Jesus se seguiram outros nascimentos.
Vós outros cristãos vos apegastes ao sentido verdadeiro, que é o de filho único. Eis aí a explicação destas palavras de que nos servimos: — o que chamais filho único.
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